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Privação do sono e suas consequências para a saúde

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O que é privação do sono?

Considera-se que uma pessoa adulta sadia necessita dormir de 7 a 9 horas por noite para manter em plenitude o seu funcionamento orgânico. É isso que requer o “relógio biológico” de cada pessoa. Privação de sono corresponde a dormir menos que isso. E, para o bem-estar pessoal, não só importa a quantidade do sono, mas também a sua qualidade.

Se a privação de sono acontece esporadicamente, seus efeitos daninhos são rapidamente compensados, mas quando a privação se torna crônica eles se tornam também mais significativos e persistentes, afetando a saúde1 mental e física. Se a privação se dá por grandes períodos contínuos, os danos à saúde1 mental são extremamente graves.

Quais são as causas da privação do sono?

A principal de todas as causas de privação do sono são os maus hábitos relacionados ao dormir. Para muitas pessoas, “dormir é uma das boas coisas da vida”, mas para outras, dormir é considerado uma perda de tempo. A privação esporádica do sono pode ser motivada por qualquer evento ocasional ou pode ser persistente, imposta pelas exigências da vida (estudo, trabalho, viagens, situações especiais, etc.).

Alguns dos motivos de deficiência de sono devem-se a razões clínicas subjacentes que precisam e devem ser investigadas, tais como insônia, síndrome2 da apneia3 do sono, bruxismo, síndrome2 das pernas inquietas, doenças decorrentes de alteração no ritmo biológico, transtornos neuropsiquiátricos, dentre outras.

Por vezes, a privação do sono é causada pela dor, por dispneia4 (“falta de ar”), tosse ou qualquer outro incômodo que interfira com o sono. Pode haver também privações esporádicas deliberadas e autocontroladas, com intuitos semióticos ou terapêuticos.

Leia sobre "Distúrbios do sono","Insônia", "Roncos" e "Ciclos do sono".

Qual é o substrato fisiopatológico da privação do sono?

Foi-se o tempo em que se acreditava que o sono era apenas um estado passivo do organismo, que começava com o adormecer e terminava com o despertar, dedicado somente ao repouso e à recuperação das energias gastas durante o dia. Hoje sabe-se que o sono não é um processo uniforme que começa à noite e só é interrompido na manhã seguinte, mas que se trata de um período de grande atividade fisiológica5.

Ele é constituído por ciclos que comportam fases diferentes, clínica e eletroencefalograficamente, um dos quais, chamado período R.E.M. (sigla em inglês para 'movimento rápido dos olhos6' - Rapid Eyes Moviments), que representa apenas 20 a 25% do sono total, mas que é essencial para o cumprimento das funções do sono.

Assim, a privação do sono age de modo diverso sobre a atenção, a memória, o raciocínio, o humor, demais funções psicológicas, sobre a pressão arterial7, a tensão muscular, as secreções hormonais, as atividades metabólicas, etc.

Quais são as características clínicas da privação do sono?

Devido às exigências da vida moderna, mais de um terço da população relata dormir menos de 7 horas por noite, e esse número tem aumentado anualmente. No Brasil, segundo dados da Associação Brasileira do Sono, as pessoas dormem em média 6,4 horas por noite, o que significa que muitas dormem ainda menos que isso. E, além de dormirem pouco, as pessoas dormem mal.

Mesmo a privação de sono em uma única noite tem importantes repercussões físicas e psicológicas no dia seguinte, mas as privações crônicas são de muito maior importância. Passar uma noite mal dormida ou mesmo sem dormir não representa um grande problema, e os transtornos que isso acarreta podem ser rapidamente compensados pelo período seguinte de sono. Mas, coisa diferente acontece com as privações crônicas de sono.

A privação do sono em uma única noite já implica em diminuição da atenção e da memória, lentificação dos reflexos e aumento do tempo de reação, dentre outras alterações. Esses efeitos são equivalentes a uma taxa de 0,05% de álcool no sangue8 e afeta funções complexas e/ou delicadas, como dirigir ou operar máquinas perigosas.

Basta uma noite mal dormida para que surjam cansaço e fadiga9, falhas de atenção e memória, tristeza e irritabilidade, elevação da pressão arterial7 e alterações hormonais diversas (melatonina, hormônio10 do crescimento, adrenalina11, TSH, etc.).

A privação do sono a mais longo prazo leva à falta de vigor físico, envelhecimento precoce, comprometimento do sistema imunológico12, tendência a desenvolver obesidade13, diabetes14 tipo 2, doenças cardiovasculares15 e gastrointestinais e perda crônica da memória.

Como evolui a privação continuada do sono?

A privação continuada do sono leva a graves distúrbios mentais, conforme o esquema seguinte:

  • 24 horas sem dormir: a privação do sono por uma noite já é suficiente para provocar o mesmo efeito que após o consumo de bebidas alcoólicas, interferindo grandemente na realização de atividades que exijam atenção e coordenação motora fina. Outros sintomas16 comuns são: irritabilidade, dificuldades de cognição17, tremores, fadiga9 e compulsão alimentar. Quem usa o computador pode constatar como aumentam seus erros de digitação.
  • 36 horas sem dormir: há uma intensificação dos sintomas16 e a vontade de dormir se torna urgente e incontrolável, havendo pequenos cochilos, de cerca de 30 segundos, sem que a pessoa perceba, o que pode provocar lapsos ou acidentes durante a realização de atividades como dirigir, por exemplo. A pessoa pode sentir ainda uma fadiga9 extrema, ter dificuldades em socializar e em tomar decisões, além de apresentar mudanças de comportamento.
  • 48 horas sem dormir: já se trata de uma privação extrema do sono. A fadiga9 e a irritabilidade se tornam ainda mais intensas e é possível que o indivíduo comece a alucinar, ouvindo e vendo coisas que de fato não existem. O estresse e a ansiedade aumentam muito, bem como as reações a eles e os comportamentos motivados por eles.
  • 72 horas sem dormir: no terceiro dia sem dormir, a necessidade de repousar fica muito mais forte e os cochilos involuntários acontecem com mais frequência. A falta de sono começa a impactar as percepções do indivíduo.
  • 96 horas sem dormir: após esse quarto dia, a percepção da realidade acaba distorcida e o pensamento coordenado já não é mais possível. A necessidade de descansar se torna insuportável e a pessoa pode ter quadros de psicose18 por privação de sono. Em geral, esses sintomas16 diminuem gradativamente e se revertem depois que a pessoa descansa o suficiente, no entanto, podem continuar se a pessoa abriga uma latência19 psicótica.
Veja também sobre "Hipersonia", "Fadiga9 crônica", "Distúrbio comportamental do sono REM" e "Inércia do sono"

 

Referências:

As informações veiculadas neste texto foram extraídas principalmente dos sites da Mayo Clinic e da Johns Hopkins Medicine.

ABCMED, 2022. Privação do sono e suas consequências para a saúde. Disponível em: <https://www.abc.med.br/p/vida-saudavel/1429420/privacao-do-sono-e-suas-consequencias-para-a-saude.htm>. Acesso em: 29 mar. 2024.
Nota ao leitor:
As notas acima são dirigidas principalmente aos leigos em medicina e têm por objetivo destacar os aspectos mais relevantes desse assunto e não visam substituir as orientações do médico, que devem ser tidas como superiores a elas. Sendo assim, elas não devem ser utilizadas para autodiagnóstico ou automedicação nem para subsidiar trabalhos que requeiram rigor científico.

Complementos

1 Saúde: 1. Estado de equilíbrio dinâmico entre o organismo e o seu ambiente, o qual mantém as características estruturais e funcionais do organismo dentro dos limites normais para sua forma de vida e para a sua fase do ciclo vital. 2. Estado de boa disposição física e psíquica; bem-estar. 3. Brinde, saudação que se faz bebendo à saúde de alguém. 4. Força física; robustez, vigor, energia.
2 Síndrome: Conjunto de sinais e sintomas que se encontram associados a uma entidade conhecida ou não.
3 Apnéia: É uma parada respiratória provocada pelo colabamento total das paredes da faringe que ocorre principalmente enquanto a pessoa está dormindo e roncando. No adulto, considera-se apnéia após 10 segundos de parada respiratória. Como a criança tem uma reserva menor, às vezes, depois de dois ou três segundos, o sangue já se empobrece de oxigênio.
4 Dispnéia: Falta de ar ou dificuldade para respirar caracterizada por respiração rápida e curta, geralmente está associada a alguma doença cardíaca ou pulmonar.
5 Fisiológica: Relativo à fisiologia. A fisiologia é estudo das funções e do funcionamento normal dos seres vivos, especialmente dos processos físico-químicos que ocorrem nas células, tecidos, órgãos e sistemas dos seres vivos sadios.
6 Olhos:
7 Pressão arterial: A relação que define a pressão arterial é o produto do fluxo sanguíneo pela resistência. Considerando-se a circulação como um todo, o fluxo total é denominado débito cardíaco, enquanto a resistência é denominada de resistência vascular periférica total.
8 Sangue: O sangue é uma substância líquida que circula pelas artérias e veias do organismo. Em um adulto sadio, cerca de 45% do volume de seu sangue é composto por células (a maioria glóbulos vermelhos, glóbulos brancos e plaquetas). O sangue é vermelho brilhante, quando oxigenado nos pulmões (nos alvéolos pulmonares). Ele adquire uma tonalidade mais azulada, quando perde seu oxigênio, através das veias e dos pequenos vasos denominados capilares.
9 Fadiga: 1. Sensação de enfraquecimento resultante de esforço físico. 2. Trabalho cansativo. 3. Redução gradual da resistência de um material ou da sensibilidade de um equipamento devido ao uso continuado.
10 Hormônio: Substância química produzida por uma parte do corpo e liberada no sangue para desencadear ou regular funções particulares do organismo. Por exemplo, a insulina é um hormônio produzido pelo pâncreas que diz a outras células quando usar a glicose para energia. Hormônios sintéticos, usados como medicamentos, podem ser semelhantes ou diferentes daqueles produzidos pelo organismo.
11 Adrenalina: 1. Hormônio secretado pela medula das glândulas suprarrenais. Atua no mecanismo da elevação da pressão sanguínea, é importante na produção de respostas fisiológicas rápidas do organismo aos estímulos externos. Usualmente utilizado como estimulante cardíaco, como vasoconstritor nas hemorragias da pele, para prolongar os efeitos de anestésicos locais e como relaxante muscular na asma brônquica. 2. No sentido informal significa disposição física, emocional e mental na realização de tarefas, projetos, etc. Energia, força, vigor.
12 Sistema imunológico: Sistema de defesa do organismo contra infecções e outros ataques de micro-organismos que enfraquecem o nosso corpo.
13 Obesidade: Condição em que há acúmulo de gorduras no organismo além do normal, mais severo que o sobrepeso. O índice de massa corporal é igual ou maior que 30.
14 Diabetes: Nome que designa um grupo de doenças caracterizadas por diurese excessiva. A mais frequente é o Diabetes mellitus, ainda que existam outras variantes (Diabetes insipidus) de doença nas quais o transtorno primário é a incapacidade dos rins de concentrar a urina.
15 Doenças cardiovasculares: Doença do coração e vasos sangüíneos (artérias, veias e capilares).
16 Sintomas: Alterações da percepção normal que uma pessoa tem de seu próprio corpo, do seu metabolismo, de suas sensações, podendo ou não ser um indício de doença. Os sintomas são as queixas relatadas pelo paciente mas que só ele consegue perceber. Sintomas são subjetivos, sujeitos à interpretação pessoal. A variabilidade descritiva dos sintomas varia em função da cultura do indivíduo, assim como da valorização que cada pessoa dá às suas próprias percepções.
17 Cognição: É o conjunto dos processos mentais usados no pensamento, percepção, classificação, reconhecimento e compreensão para o julgamento através do raciocínio para o aprendizado de determinados sistemas e soluções de problemas.
18 Psicose: Grupo de doenças psiquiátricas caracterizadas pela incapacidade de avaliar corretamente a realidade. A pessoa psicótica reestrutura sua concepção de realidade em torno de uma idéia delirante, sem ter consciência de sua doença.
19 Latência: 1. Estado, caráter daquilo que se acha latente, oculto. 2. Por extensão de sentido, é o período durante o qual algo se elabora, antes de assumir existência efetiva. 3. Em medicina, é o intervalo entre o começo de um estímulo e o início de uma reação associada a este estímulo; tempo de reação. 4. Em psicanálise, é o período (dos quatro ou cinco anos até o início da adolescência) durante o qual o interesse sexual é sublimado; período de latência.
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