Porre seco: o que é isso?
O que é porre seco?
O alcoolismo não consiste apenas no vício em beber álcool, mas também nas profundas mudanças de personalidade que sobrevêm ou se agravam com ele. Muitos alcoólicos deixam de beber, mas não modificam certos traços de personalidade característicos dos alcoólicos, continuando com eles mesmo depois de largar o álcool. Sem uma completa e feliz solução de ambos os pontos, é quase certo que o indivíduo retorne ao álcool.
A expressão “porre seco” é usada entre os membros do Alcoólicos Anônimos (AA) para descrever o que se passa com o indivíduo alcoólatra após deixar de beber, devido principalmente a essas persistências. A expressão descreve os sintomas1 que o alcoólico sente quando parou de beber, e é típica do AA; na Medicina não há nenhum quadro clínico com esse nome.
Entre os membros de um grupo do AA existem dois tipos de pessoas:
- As que se recuperam do alcoolismo, evitando o primeiro gole de bebidas alcoólicas, mas que param nisto; ou seja, param de beber, mas continuam com complicações de personalidade que afetam seus relacionamentos.
- As que param de ingerir bebidas alcoólicas e se interessam em buscar a sobriedade.
Segundo o AA, abstinência e sobriedade são coisas diferentes. A abstinência é apenas o alicerce com o qual se deve tentar construir o edifício da sobriedade. Ela é apenas deixar de beber; sobriedade implica não apenas em deixar de beber, mas também experimentar uma mudança de todos os aspectos negativos da personalidade alcoólica.
Ambas são difíceis de serem alcançadas, mas são igualmente essenciais. Sem uma das duas, o indivíduo quase certamente volta ao alcoolismo.
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Quais são as características clínicas da síndrome2 do porre seco?
As características da personalidade do alcoólatra que pressionam no sentido da recaída no alcoolismo incluem:
» Imaturidade e infantilismo
A incapacidade de crescer emocionalmente é o sintoma3 principal do porre seco. Mesmo sem beber, o alcoólico continua sendo como uma criança em sua maneira de pensar, lidar com suas emoções e agir. Continuando uma criança emocionalmente, terá dificuldades ou mesmo não poderá alcançar seus objetivos na vida e seguirá dependendo de sua mãe, seu pai, seus irmãos, sua esposa, seus amigos, seu chefe, etc. Esta dependência impede que a pessoa obtenha uma sobriedade definitiva, porque falta-lhe autonomia e responsabilidade.
» Atitude permanente de desonestidade consigo mesmo e com os demais
A desonestidade de caráter é um mau hábito que o alcoólico adquiriu ao longo de sua dependência e que permanece mesmo depois de deixar de beber. Engana, mente, inventa pretextos, promete e não cumpre, pratica a fraude, não respeita as regras do jogo, pede emprestado e não paga e pratica todo tipo de corruptelas. Segue mentindo para sua esposa, seu terapeuta e mesmo para seu grupo do AA...
» Amargura e insatisfação emocional
Apesar de já não beber, o alcoólico não consegue sentir a alegria de viver. É descontente e inconformado, sem poder desfrutar as benesses da sobriedade. Guarda ainda muitos ressentimentos de sua vida passada que não consegue superar. O deixar de beber constitui para ele uma obrigação, mais que uma convicção.
» Sentimento permanente de culpa
Alguns alcoólicos arrastam atrás de si um lastro terrível de culpabilidade por eventos passados, reais ou supostos, dos quais não conseguem se perdoar. Como isso, sentem-se de menos valor que os demais, com sentimentos de autodesvalorização pessoal. Desenvolvem uma necessidade neurótica de expiação e caem em condutas autodestrutivas, sem se sentirem merecedores de nenhuma felicidade. Estas tendências autodestrutivas podem provocar-lhes recaídas totais ou episódicas.
» Egocentrismo, autossuficiência neurótica e tendência à onipotência
O egocentrismo do alcoólatra é a compensação de um sentimento de inferioridade e uma baixa autoestima. A autossuficiência neurótica é típica daquele que segue pensando que não necessita da ajuda dos demais e que ele sozinho pode conseguir tudo. Quando a autossuficiência neurótica se exacerba, converte-se em onipotência, um complexo de superioridade que disfarça um profundo complexo de inferioridade.
» Medos permanentes
Muitos alcoólicos vivem permanentemente angustiados. De fato, já viviam sob tensão desde antes de beber e aquilo que os levou ao alcoolismo foi a necessidade de aliviar suas tensões por meio do álcool. Esses indivíduos são geralmente muito inseguros, apreensivos e vivem em constante estado de tensão, com medos genéricos de todas as coisas. Isso afeta a saúde4, pois vivem em tensão contínua e sob estresse prolongado.
» Depressão cíclica
São pessoas muito vulneráveis no aspecto emocional e quase sempre estão tristes, com pouco vigor, desmotivadas e com pouco desejo de viver.
» Ingovernabilidade sexual e sentimental
O alcoólico tem muitos problemas para relacionar-se com o sexo oposto. E, por outro lado, em estado de intoxicação alcoólica afloram sem controle os impulsos sexuais mais primitivos, dando lugar a condutas indesejáveis, como violência sexual ou conduta homossexual, por exemplo. Também são apresentados problemas de ejaculação5 precoce, impotência6 ou frigidez. A infidelidade para com a(o) companheira(o) e a tendência à promiscuidade sexual é outra manifestação de porre seco a nível sexual e sentimental.
» Negação de sua realidade
O alcoólico segue sendo um negador mesmo depois de parar de beber. Nega seu alcoolismo, nega uma série de defeitos de caráter, etc. E ainda se aborrece muito quando alguém o confronta com suas negações. Por isso, costuma mudar de grupo frequentemente, isso quando não volta a beber.
» Substituição do álcool
Muitos alcoólicos ao deixarem de beber substituem sua conduta compulsiva pelo álcool por outro tipo de droga ou por condutas tais como jogo compulsivo, sexo compulsivo ou vício no trabalho.
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Referências:
As informações veiculadas neste texto foram extraídas principalmente do site do "Alcoólicos Anônimos".
As notas acima são dirigidas principalmente aos leigos em medicina e têm por objetivo destacar os aspectos mais relevantes desse assunto e não visam substituir as orientações do médico, que devem ser tidas como superiores a elas. Sendo assim, elas não devem ser utilizadas para autodiagnóstico ou automedicação nem para subsidiar trabalhos que requeiram rigor científico.