Cetoacidose alcoólica - como ela se manifesta? O que fazer?
O que é cetoacidose alcoólica?
A cetoacidose alcoólica é uma complicação metabólica que combina a utilização excessiva de álcool com a baixa ingesta calórica, e se caracteriza por hipercetonemia (níveis elevados de cetona sérica) e acidose metabólica1, sem hiperglicemia2 significativa, com uma concentração normal ou baixa de glicose3.
Quais são as causas da cetoacidose alcoólica?
A maioria dos casos ocorre quando uma pessoa que faz uso excessivo e prolongado de álcool, de repente, por qualquer razão, diminui a ingestão energética. Além disso, a cetoacidose alcoólica é frequentemente precipitada pela presença de outra doença médica, como infecção4 ou pancreatite5, por exemplo. O metabolismo6 do álcool em si mesmo parece ser o maior contribuinte para a cetose, mas além dele, contribuem: a desidratação7, a restrição calórica, em que os triglicerídeos armazenados no tecido adiposo8 sofrem lipólise, e a cetogênese.
Os 3 principais eventos predisponentes da cetoacidose alcoólica são: (1) atraso e diminuição da secreção de insulina9 e secreção excessiva de glucagon10; (2) relação elevada da forma reduzida de nicotinamida adenina dinucleotídeo; (3) depleção11 de volume líquido resultante de vômitos12 com ingestão oral deficiente de fluidos.
Saiba mais sobre "Náuseas13 e vômitos12", "Desidratação7" e "Pancreatite5".
Qual é o mecanismo fisiopatológico da cetoacidose alcoólica?
A patogênese14 da cetoacidose alcoólica é complexa. Embora os fatores gerais e os mecanismos que levam a ela sejam relativamente compreendidos, os fatores precisos ainda não foram totalmente elucidados. Durante a estarvação (privação de alimentos), há diminuição da secreção de insulina9 e aumento da atividade dos hormônios contrarreguladores. A lipase sensível aos hormônios é normalmente inibida pela insulina9 e quando os níveis dela diminuem, a lipólise aumenta, causando a libertação de ácidos gordurosos livres do tecido adiposo8 periférico.
A diminuição da relação insulina9/glucagon10, que ocorre na privação de alimento, permite que mais ácidos graxos livres sofram oxidação e formação de corpos cetônicos. Adicionalmente, o vômito15 prolongado leva à desidratação7, o que diminui a perfusão renal16, limitando a excreção urinária de cetoácidos. Além disso, a depleção11 de volume líquido no organismo aumenta a concentração de hormônios contrarreguladores, estimulando ainda mais a lipólise e a cetogênese.
Em resumo, o álcool diminui a gliconeogênese17 hepática18 e provoca diminuição da secreção de insulina9, aumento da lipólise, alteração da oxidação de ácidos graxos e cetogênese subsequente. Os hormônios contrarreguladores estão aumentados e podem inibir ainda mais a secreção de insulina9. As concentrações plasmáticas de glicose3 são, em geral, baixas ou normais, mas uma hiperglicemia2 discreta ocorre algumas vezes.
Quais são as principais características clínicas da cetoacidose alcoólica?
Pacientes com cetoacidose alcoólica quase sempre são alcoólatras crônicos que antes do desenvolvimento da cetoacidose fizeram um consumo muito pesado de álcool, com subsequente interrupção abrupta do mesmo e pouca ou nenhuma ingestão de alimentos. Tais apresentações normalmente resultam de manifestações físicas como náusea19, vômito15, dor abdominal, dispneia20, tremor, tontura21, dor muscular, diarreia22, síncope23, convulsão24, hematêmese25 ou melena26 e são atribuíveis à gastrite27 alcoólica ou à pancreatite5.
Embora a cetoacidose alcoólica ocorra mais comumente em alcoólatras adultos, ela tem sido também relatada em pessoas de todas as idades. Uma alcalose28 metabólica concomitante é comum, secundária a vômitos12 e depleção11 de volume líquido. A cetoacidose alcoólica em si mesma causa náuseas13, vômitos12 e dor abdominal.
Leia sobre "Alcoolismo", "Síncope23", "Melena26 e hematêmese" e "Gastrite27".
Como o médico diagnostica a cetoacidose alcoólica?
O diagnóstico29 se faz por meio da história clínica e do achado de cetoacidose sem hiperglicemia2. A avaliação diagnóstica deve incluir, além de um histórico clínico cuidadoso, uma avaliação para cetonemia ou cetonúria30, um exame de urina31 e uma medição dos níveis séricos de toxinas32.
Como a cetoacidose alcoólica frequentemente é precipitada por outra doença médica, a avaliação diagnóstica deve incluir uma pesquisa de potenciais fatores precipitantes. Um diferencial deve ser feito com a cetoacidose diabética33, a acidose34 láctica35, a acidose metabólica1, a uremia36 e a síndrome37 de abstinência, entre outras.
Como o médico trata a cetoacidose alcoólica?
O tratamento da cetoacidose alcoólica é direcionado para reverter as três principais causas fisiopatológicas da síndrome37, que são: (1) depleção11 do volume do líquido extracelular; (2) depleção11 de glicogênio38 e (3) uma proporção elevada de nicotinamida adenina dinucleotídeo. Este objetivo pode ser alcançado através da administração de soluções de dextrose39 e soluções salinas.
Como evolui a cetoacidose alcoólica?
Se a intervenção médica se der de forma oportuna e incisiva, o prognóstico40 de recuperação da cetoacidose alcoólica é bom. O prognóstico40 a longo prazo, contudo, dependerá da recuperação do próprio alcoolismo.
A mortalidade41 é rara, no entanto, cetoacidose alcoólica tem sido relatada como causa de morte em vários alcoólatras. O ácido beta-hidroxibutírico marcadamente elevado pode levar à morte.
Quais são as complicações possíveis da cetoacidose alcoólica?
A mortalidade41 e a morbidade42 da cetoacidose alcoólica não complicada são raras. A principal causa de morbimortalidade não decorre da acidose34 em si, mas do tratamento inadequado de condições médicas ou cirúrgicas concomitantes, como sangramento gastrointestinal e abstinência alcoólica.
Complicações decorrentes da cetoacidose alcoólica ocorrem em menos de 20% dos pacientes. As complicações mais comumente associadas à cetoacidose alcoólica são: convulsões, arritmias43, parada cardíaca, choque44, infecção4, edema pulmonar45 e delirium tremens46.
Veja também sobre "Síndrome37 da abstinência", "Delirium tremens46" e "Acidose34 láctica35".
As notas acima são dirigidas principalmente aos leigos em medicina e têm por objetivo destacar os aspectos mais relevantes desse assunto e não visam substituir as orientações do médico, que devem ser tidas como superiores a elas. Sendo assim, elas não devem ser utilizadas para autodiagnóstico ou automedicação nem para subsidiar trabalhos que requeiram rigor científico.