Insensibilidade congênita à dor
O que é insensibilidade congênita1 à dor?
A insensibilidade congênita1 à dor, também dita analgesia congênita1, é uma condição extraordinariamente rara, afetando poucos indivíduos, mas com ampla distribuição pelo mundo, na qual uma pessoa, desde o nascimento, é incapaz de sentir dor física. Pessoas com essa condição podem sentir a diferença entre afiado e rombudo e quente e frio, mas não podem sentir, por exemplo, a dor de uma bebida quente queimando sua língua2. O quadro clínico geralmente decorre com anidrose (ausência de suor), o que afeta a regulação da temperatura do corpo exercida pelo suor.
Há dois tipos distintos de insensibilidade congênita1 à dor: (1) quando a pessoa não percebe a dor e (2) quando a pessoa percebe a dor, mas não há uma reação a ela.
Quais são as causas da insensibilidade congênita1 à dor?
A insensibilidade congênita1 à dor é genética, causada por mutações do gene SCN9A e, em casos raros, por mutações no gene PMRD12. Ela é herdada em um padrão autossômico3 recessivo, o que significa que as cópias do gene em cada célula4 têm as mesmas mutações. Os pais de um indivíduo com uma condição autossômica5 recessiva carregam uma cópia do gene mutado, mas normalmente não apresentam sinais6 ou sintomas7 da doença.
Leia sobre "Considerações sobre a clínica da dor", "Mutações genéticas" e "Genética - conceitos básicos".
Qual é o substrato fisiopatológico da insensibilidade congênita1 à dor?
Os canais de sódio desempenham um papel fundamental na capacidade da célula4 de gerar e transmitir sinais6 elétricos de dor. O gene SCN9A fornece instruções para o funcionamento correto dos canais de sódio chamados NaV1.7. Os canais NaV1.7 são encontrados nas células nervosas8 e neurônios9 sensoriais olfativos e ligam os sinais6 nervosos periféricos ao sistema nervoso central10.
Como resultado dessas mutações, os canais de sódio não podem ser formados. Sem que estejam funcionando corretamente, essa ligação não se faz e eles não transmitem os sinais6 de dor para a medula espinhal11 e para o cérebro12. É a ausência deles que torna os pacientes afetados insensíveis à dor e ao olfato.
A insensibilidade congênita1 à dor é considerada uma forma de neuropatia periférica13 porque afeta o sistema nervoso periférico14 que conecta o cérebro12 e a medula espinhal11 aos músculos15 e às células16 que detectam as sensações de dor. A partir de 1980, foi possível verificar que esta insensibilidade se deve a alterações nas fibras nervosas responsáveis por transmitirem impulsos que causam dor.
Há também quem acredite que esta condição resulte de uma superprodução de endorfinas pelo cérebro12. Todavia, esta hipótese tem sofrido vigorosas contestações.
Quais são as características clínicas da insensibilidade congênita1 à dor?
A dor é uma experiência indispensável ao ser humano, visto que ela funciona como um aviso e defesa contra algo que esteja caminhando mal no organismo. Por isso, a insensibilidade congênita1 à dor, ao invés de ser um privilégio, é uma condição extremamente perigosa. Nas pessoas afetadas pela condição, a insensibilidade à dor está presente desde o nascimento (congênita1) e, com o passar do tempo, a falta de consciência da dor pode levar a um acúmulo de lesões17 e problemas de saúde18 que podem afetar a expectativa de vida19.
As crianças afetadas podem sofrer danos simples que se tornam perigosos porque elas não se dão conta nem se defendem deles. Um cisco no olho20, por exemplo, que normalmente é um evento banal, pode se tornar algo muito sério, com infecções21 e danos na córnea22.
Muitas pessoas com insensibilidade congênita1 à dor também têm uma perda completa do olfato (anosmia), mas nos casos em que há mutações no gene PRDM12 os pacientes apresentam olfato normal, embora tenham maior predisposição a infecções21 e maior incidência23 de abrasões da córnea22 devido à pequena produção de lágrimas.
Os problemas clínicos mais frequentes em pacientes com insensibilidade congênita1 à dor são: febre24, anidrose, osteomielite25, fraturas, artropatias e necrose26 avascular.
Como diagnosticar a insensibilidade congênita1 à dor?
Não há nenhum teste objetivo capaz de diagnosticar a presença ou não de uma dor. Só a descrição subjetiva do indivíduo ajudará o médico a fazer esse diagnóstico27. No entanto, é um diagnóstico27 difícil, por se tratar quase sempre de crianças muito pequenas, incapazes de transmitir as suas experiências.
Como tratar a insensibilidade congênita1 à dor?
Ainda não há cura para a insensibilidade congênita1 à dor. Os tratamentos disponíveis consistem em controlar a temperatura corporal, prevenir a autolesão e tratar problemas ortopédicos o mais rápido possível. É muito importante controlar a temperatura corporal durante uma eventual cirurgia porque a regulação fisiológica28 automática também está alterada.
Foi assinalado que a naloxona, um antagonista29 opioide, permitiu que uma mulher com insensibilidade congênita1 à dor experimentasse a dor pela primeira vez, e efeitos semelhantes têm sido observados em camundongos. Dessa forma, há a expectativa de que os antagonistas opioides possam vir a ser utilizados no tratamento da doença.
Como evolui a insensibilidade congênita1 à dor?
É comum que pessoas com essa condição morram ainda na infância devido a lesões17 ou doenças que passam despercebidas. Estima-se que a maioria dos indivíduos acometidos por essa doença morra antes dos três anos de idade devido às complicações decorrentes dela.
Quais são as complicações possíveis com a insensibilidade congênita1 à dor?
A falta de consciência da dor pode levar a um acúmulo de feridas, contusões, ossos quebrados e outros problemas de saúde18 que podem passar despercebidos. Essas lesões17 não detectadas geralmente levam a uma expectativa de vida19 reduzida.
Veja também sobre "A dor como relatada pelos pacientes", "Neurites30 periféricas", "Dor crônica" e "Importância do suor para o organismo".
Referências:
As informações veiculadas neste texto foram extraídas principalmente dos sites do GARD – Genetic and Rare Diseases Information Center e da NORD – National Organization for Rare Disorders.
As notas acima são dirigidas principalmente aos leigos em medicina e têm por objetivo destacar os aspectos mais relevantes desse assunto e não visam substituir as orientações do médico, que devem ser tidas como superiores a elas. Sendo assim, elas não devem ser utilizadas para autodiagnóstico ou automedicação nem para subsidiar trabalhos que requeiram rigor científico.