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RNA mensageiro: como funciona, para que serve e por que revolucionou a medicina moderna

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O que é RNA?

O RNA (ácido ribonucleico) é uma molécula essencial para a vida, desempenhando papéis centrais na biologia molecular. Ele é um polímero de nucleotídeos composto por uma fita simples que contém as bases nitrogenadas adenina (A), citosina (C), guanina (G) e uracila (U), diferente do DNA, que possui timina (T) no lugar da uracila.

O RNA é sintetizado a partir do DNA por meio da transcrição e atua em diversas funções celulares, como a tradução de informações genéticas em proteínas1, a regulação gênica e até mesmo como componente estrutural de organelas, como os ribossomos.

Existem diferentes tipos de RNA, incluindo o RNA ribossômico (rRNA), o RNA transportador (tRNA) e o RNA mensageiro (mRNA), que será o foco deste texto.

O que é RNA mensageiro?

O RNA mensageiro (mRNA) é um tipo de RNA que carrega a informação genética do DNA, localizado no núcleo das células eucarióticas2, até os ribossomos no citoplasma3, onde ocorre a síntese de proteínas1 — processo conhecido como tradução. Ele funciona como um molde ou “mensagem” que contém as instruções para a construção de uma proteína específica.

O mRNA é sintetizado pela enzima4 RNA polimerase durante a transcrição, na qual uma sequência específica do DNA é copiada para gerar uma molécula complementar de RNA. Após sua formação, o mRNA em eucariotos passa por um processamento indispensável, que inclui a adição do Cap 5' (um nucleotídeo modificado), a formação da Cauda Poli-A (sequência de adeninas) na extremidade 3' e a remoção de Introns (regiões não codificantes) por meio do splicing5. Essas etapas garantem maior estabilidade, aumentam a eficiência da tradução e evitam que o mRNA seja degradado precocemente no citoplasma3.

O mRNA é uma molécula transitória, cuja meia-vida varia amplamente conforme o tipo celular, o estado fisiológico6 e a necessidade de produção proteica, podendo ir de minutos a várias horas. Sua sequência de nucleotídeos é complementar à do DNA, mas com uracila substituindo a timina, e determina a sequência de aminoácidos da proteína produzida de acordo com o código genético. Cada conjunto de três nucleotídeos, chamado códon, especifica um aminoácido ou um sinal7 de parada, etapa essencial para a correta formação das proteínas1.

Veja sobre "Genética - conceitos básicos", "Cariótipo fetal", "Hereditariedade8" e "Aconselhamento genético".

Quais são as aplicações do RNA mensageiro?

O RNA mensageiro tem aplicações revolucionárias, especialmente na medicina moderna. A possibilidade de utilizar mRNA sintético para codificar proteínas1 específicas abriu portas para o desenvolvimento de terapias e vacinas inovadoras. As principais aplicações incluem:

  • Vacinas: a tecnologia de mRNA ganhou destaque global com o desenvolvimento das vacinas contra a COVID-19, como as da Pfizer-BioNTech e Moderna. Nelas, o mRNA sintético codifica a proteína spike do SARS-CoV-2. Quando administrado, esse mRNA orienta temporariamente as células9 a produzirem essa proteína viral, desencadeando uma resposta imune protetora sem causar a doença. Essa abordagem permite desenvolvimento rápido de vacinas, já que o mRNA pode ser sintetizado em laboratório sem necessidade de cultivar vírus10.
  • Terapias gênicas: o mRNA pode ser usado para tratar doenças genéticas, induzindo a produção temporária de proteínas1 ausentes ou defeituosas. O conceito não altera o DNA do paciente, mas fornece uma “instrução temporária” para produzir a proteína funcional, como no caso de terapias experimentais voltadas para corrigir deficiências na proteína CFTR na fibrose cística11.
  • Imunoterapia contra o câncer12: o mRNA pode estimular o sistema imunológico13 a reconhecer e combater células9 cancerígenas. Ele pode codificar antígenos14 tumorais específicos, permitindo uma resposta imune direcionada e personalizada, com potencial para aumentar a eficácia e reduzir efeitos adversos.
  • Terapias para doenças raras: sua flexibilidade permite o desenvolvimento de tratamentos individualizados para doenças raras em que mutações impedem a produção de proteínas1 essenciais. O mRNA sintético pode suprir temporariamente essa função, viabilizando abordagens terapêuticas antes consideradas impraticáveis.

Quais são os usos atuais do RNA mensageiro?

Atualmente, o uso mais expressivo do mRNA está nas vacinas contra a COVID-19, que representaram um marco histórico da biotecnologia. Essas vacinas demonstraram alta eficácia na prevenção de formas graves da doença e foram produzidas em tempo recorde, graças à rapidez na síntese laboratorial do mRNA.

Além disso, a tecnologia vem sendo investigada em ensaios clínicos15 para outras vacinas, incluindo influenza16, Zika, HIV17 e citomegalovírus18. Embora ainda em diferentes fases de desenvolvimento, essas vacinas mostram potencial para transformar a prevenção de doenças infecciosas.

Na área terapêutica19, o mRNA está sendo explorado em tratamentos experimentais para câncer12, doenças cardiovasculares20 e condições genéticas. Terapias baseadas em mRNA podem induzir a produção de proteínas1 que regeneram tecidos, controlam processos inflamatórios ou modulam a resposta imune. Ensaios clínicos15 conduzidos por diversas empresas buscam avaliar a segurança e a eficácia dessas estratégias.

Quais são os efeitos colaterais21 possíveis das vacinas de mRNA?

As vacinas de mRNA, como quaisquer vacinas, podem causar efeitos colaterais21 — a maioria leve e de curta duração. Os mais comuns incluem dor no local da aplicação, fadiga22, febre23 baixa, dor muscular, calafrios24 e dor de cabeça25. Esses sintomas26 refletem a ativação do sistema imunológico13 e costumam desaparecer em 24 a 48 horas.

Reações alérgicas graves são raras, mas possíveis, e geralmente estão relacionadas a componentes das nanopartículas lipídicas, como o polietilenoglicol (PEG). Miocardite27 e pericardite28 foram descritas, especialmente em homens jovens após a segunda dose, porém são eventos incomuns, geralmente apresentam evolução benigna e respondem bem ao tratamento clínico.

Importante destacar que as vacinas de mRNA não interagem com o DNA humano e não permanecem no organismo por longos períodos: o mRNA é degradado rapidamente após cumprir sua função.

Quais são as perspectivas futuras do RNA mensageiro?

O futuro do mRNA é extremamente promissor, com avanços que podem transformar áreas inteiras da medicina. Entre as perspectivas mais relevantes estão:

  • Vacinas universais: pesquisadores buscam desenvolver vacinas de mRNA capazes de proteger contra múltiplas variantes de um mesmo vírus10 ou até contra diferentes vírus10. Uma vacina29 universal contra influenza16, que ofereça proteção estável contra todas as cepas30, é um dos objetivos mais estudados.
  • Terapias personalizadas: a tecnologia de mRNA permite criar tratamentos sob medida de acordo com o perfil genético do paciente. No câncer12, por exemplo, vacinas personalizadas de mRNA podem ser projetadas para atacar antígenos14 exclusivos de cada tumor31.
  • Resposta rápida a doenças emergentes: como o mRNA pode ser projetado e sintetizado rapidamente, vacinas contra novos patógenos podem ser desenvolvidas em semanas. Isso representa uma estratégia crucial para lidar com futuras pandemias.
  • Tratamento de doenças crônicas e neurológicas: aplicações experimentais incluem o uso de mRNA para estimular regeneração neuronal, reduzir placas32 amiloides no Alzheimer33 ou modular proteínas1 associadas ao Parkinson. Embora ainda em fases iniciais, esses estudos apontam para possibilidades terapêuticas antes inalcançáveis.
  • Melhorias na entrega e estabilidade: um dos principais desafios atuais é a entrega eficiente do mRNA às células9-alvo, pois ele é naturalmente instável e suscetível à degradação. Avanços em nanotecnologia, como nanopartículas lipídicas, têm aprimorado a estabilidade e a eficácia da entrega, e novas plataformas devem tornar essas terapias ainda mais eficientes.

Com a ampliação da escala de produção, espera-se que vacinas e terapias à base de mRNA se tornem mais acessíveis globalmente, especialmente em países em desenvolvimento, contribuindo para a redução das desigualdades em saúde34.

Leia sobre "Mutações genéticas", "Mutações cromossômicas", "Edição genética" e "Antígenos14 e anticorpos35".

 

Referências:

As informações veiculadas neste texto foram extraídas principalmente dos sites do Jornal da USP da Universidade Federal da Integração Latino Americana.

ABCMED, 2025. RNA mensageiro: como funciona, para que serve e por que revolucionou a medicina moderna. Disponível em: <https://www.abc.med.br/p/1497685/rna-mensageiro-como-funciona-para-que-serve-e-por-que-revolucionou-a-medicina-moderna.htm>. Acesso em: 12 dez. 2025.
Nota ao leitor:
As notas acima são dirigidas principalmente aos leigos em medicina e têm por objetivo destacar os aspectos mais relevantes desse assunto e não visam substituir as orientações do médico, que devem ser tidas como superiores a elas. Sendo assim, elas não devem ser utilizadas para autodiagnóstico ou automedicação nem para subsidiar trabalhos que requeiram rigor científico.

Complementos

1 Proteínas: Um dos três principais nutrientes dos alimentos. Alimentos que fornecem proteína incluem carne vermelha, frango, peixe, queijos, leite, derivados do leite, ovos.
2 Células Eucarióticas: Células dos organismos superiores, contendo um núcleo verdadeiro delimitado por uma membrana nuclear.
3 Citoplasma: A parte da célula que contém o CITOSSOL e pequenas estruturas, excluindo o NÚCLEO CELULAR, MITOCÔNDRIA e os VACÚOLOS grandes. (Tradução livre do original
4 Enzima: Proteína produzida pelo organismo que gera uma reação química. Por exemplo, as enzimas produzidas pelo intestino que ajudam no processo digestivo.
5 Splicing: O “splicing“ só ocorre em células eucarióticas e consiste na remoção de fragmentos de um RNA recém-sintetizado, chamado de pré-RNA. Isso se passa no núcleo da célula (embora já haja indícios que possa se dar no citoplasma de neurônios). Esses pedaços removidos são chamados de íntrons. Os pedaços que persistem no RNA maduro são conhecidos como éxons.
6 Fisiológico: Relativo à fisiologia. A fisiologia é estudo das funções e do funcionamento normal dos seres vivos, especialmente dos processos físico-químicos que ocorrem nas células, tecidos, órgãos e sistemas dos seres vivos sadios.
7 Sinal: 1. É uma alteração percebida ou medida por outra pessoa, geralmente um profissional de saúde, sem o relato ou comunicação do paciente. Por exemplo, uma ferida. 2. Som ou gesto que indica algo, indício. 3. Dinheiro que se dá para garantir um contrato.
8 Hereditariedade: Conjunto de eventos biológicos responsáveis pela transmissão de uma herança a seus descendentes através de seus genes. Existem dois tipos de hereditariedade: especifica e individual. A hereditariedade especifica é responsavel pela transmissão de agentes genéticos que determinam a herança de características comuns a uma determinada espécie. A hereditariedade individual designa o conjunto de agentes genéticos que atuam sobre os traços e características próprios do indivíduo que o tornam um ser diferente de todos os outros.
9 Células: Unidades (ou subunidades) funcionais e estruturais fundamentais dos organismos vivos. São compostas de CITOPLASMA (com várias ORGANELAS) e limitadas por uma MEMBRANA CELULAR.
10 Vírus: Pequeno microorganismo capaz de infectar uma célula de um organismo superior e replicar-se utilizando os elementos celulares do hospedeiro. São capazes de causar múltiplas doenças, desde um resfriado comum até a AIDS.
11 Fibrose cística: Doença genética autossômica recessiva que promove alteração de glândulas exócrinas do organismo. Caracterizada por infecções crônicas das vias aéreas, que leva ao desenvolvimento de bronquiectasias, insuficiência pancreática exócrina, disfunções intestinais, anormalidades das glândulas sudoríparas e disfunção genitourinária.
12 Câncer: Crescimento anormal de um tecido celular capaz de invadir outros órgãos localmente ou à distância (metástases).
13 Sistema imunológico: Sistema de defesa do organismo contra infecções e outros ataques de micro-organismos que enfraquecem o nosso corpo.
14 Antígenos: 1. Partículas ou moléculas capazes de deflagrar a produção de anticorpo específico. 2. Substâncias que, introduzidas no organismo, provocam a formação de anticorpo.
15 Ensaios clínicos: Há três fases diferentes em um ensaio clínico. A Fase 1 é o primeiro teste de um tratamento em seres humanos para determinar se ele é seguro. A Fase 2 concentra-se em saber se um tratamento é eficaz. E a Fase 3 é o teste final antes da aprovação para determinar se o tratamento tem vantagens sobre os tratamentos padrões disponíveis.
16 Influenza: Doença infecciosa, aguda, de origem viral que acomete o trato respiratório, ocorrendo em epidemias ou pandemias e frequentemente se complicando pela associação com outras infecções bacterianas.
17 HIV: Abreviatura em inglês do vírus da imunodeficiência humana. É o agente causador da AIDS.
18 Citomegalovírus: Citomegalovírus (CMV) é um vírus pertence à família do herpesvírus, a mesma dos vírus da catapora, herpes simples, herpes genital e do herpes zóster.
19 Terapêutica: Terapia, tratamento de doentes.
20 Doenças cardiovasculares: Doença do coração e vasos sangüíneos (artérias, veias e capilares).
21 Efeitos colaterais: 1. Ação não esperada de um medicamento. Ou seja, significa a ação sobre alguma parte do organismo diferente daquela que precisa ser tratada pelo medicamento. 2. Possível reação que pode ocorrer durante o uso do medicamento, podendo ser benéfica ou maléfica.
22 Fadiga: 1. Sensação de enfraquecimento resultante de esforço físico. 2. Trabalho cansativo. 3. Redução gradual da resistência de um material ou da sensibilidade de um equipamento devido ao uso continuado.
23 Febre: É a elevação da temperatura do corpo acima dos valores normais para o indivíduo. São aceitos como valores de referência indicativos de febre: temperatura axilar ou oral acima de 37,5°C e temperatura retal acima de 38°C. A febre é uma reação do corpo contra patógenos.
24 Calafrios: 1. Conjunto de pequenas contrações da pele e dos músculos cutâneos ao longo do corpo, muitas vezes com tremores fortes e palidez, que acompanham uma sensação de frio provocada por baixa temperatura, má condição orgânica ou ainda por medo, horror, nojo, etc. 2. Sensação de frio e tremores fortes, às vezes com bater de dentes, que precedem ou acompanham acessos de febre.
25 Cabeça:
26 Sintomas: Alterações da percepção normal que uma pessoa tem de seu próprio corpo, do seu metabolismo, de suas sensações, podendo ou não ser um indício de doença. Os sintomas são as queixas relatadas pelo paciente mas que só ele consegue perceber. Sintomas são subjetivos, sujeitos à interpretação pessoal. A variabilidade descritiva dos sintomas varia em função da cultura do indivíduo, assim como da valorização que cada pessoa dá às suas próprias percepções.
27 Miocardite: 1. Inflamação das paredes musculares do coração. 2. Infecção do miocárdio causada por bactéria, vírus ou outros microrganismos.
28 Pericardite: Inflamação da membrana que recobre externamente o coração e os vasos sanguíneos que saem dele. Os sintomas dependem da velocidade e grau de lesão que produz. Variam desde dor torácica, febre, até o tamponamento cardíaco, que é uma emergência médica potencialmente fatal.
29 Vacina: Tratamento à base de bactérias, vírus vivos atenuados ou seus produtos celulares, que têm o objetivo de produzir uma imunização ativa no organismo para uma determinada infecção.
30 Cepas: Cepa ou estirpe é um termo da biologia e da genética que se refere a um grupo de descendentes com um ancestral comum que compartilham semelhanças morfológicas e/ou fisiológicas.
31 Tumor: Termo que literalmente significa massa ou formação de tecido. É utilizado em geral para referir-se a uma formação neoplásica.
32 Placas: 1. Lesões achatadas, semelhantes à pápula, mas com diâmetro superior a um centímetro. 2. Folha de material resistente (metal, vidro, plástico etc.), mais ou menos espessa. 3. Objeto com formato de tabuleta, geralmente de bronze, mármore ou granito, com inscrição comemorativa ou indicativa. 4. Chapa que serve de suporte a um aparelho de iluminação que se fixa em uma superfície vertical ou sobre uma peça de mobiliário, etc. 5. Placa de metal que, colocada na dianteira e na traseira de um veículo automotor, registra o número de licenciamento do veículo. 6. Chapa que, emitida pela administração pública, representa sinal oficial de concessão de certas licenças e autorizações. 7. Lâmina metálica, polida, usualmente como forma em processos de gravura. 8. Área ou zona que difere do resto de uma superfície, ordinariamente pela cor. 9. Mancha mais ou menos espessa na pele, como resultado de doença, escoriação, etc. 10. Em anatomia geral, estrutura ou órgão chato e em forma de placa, como uma escama ou lamela. 11. Em informática, suporte plano, retangular, de fibra de vidro, em que se gravam chips e outros componentes eletrônicos do computador. 12. Em odontologia, camada aderente de bactérias que se forma nos dentes.
33 Alzheimer: Doença degenerativa crônica que produz uma deterioração insidiosa e progressiva das funções intelectuais superiores. É uma das causas mais freqüentes de demência. Geralmente começa a partir dos 50 anos de idade e tem incidência similar entre homens e mulheres.
34 Saúde: 1. Estado de equilíbrio dinâmico entre o organismo e o seu ambiente, o qual mantém as características estruturais e funcionais do organismo dentro dos limites normais para sua forma de vida e para a sua fase do ciclo vital. 2. Estado de boa disposição física e psíquica; bem-estar. 3. Brinde, saudação que se faz bebendo à saúde de alguém. 4. Força física; robustez, vigor, energia.
35 Anticorpos: Proteínas produzidas pelo organismo para se proteger de substâncias estranhas como bactérias ou vírus. As pessoas que têm diabetes tipo 1 produzem anticorpos que destroem as células beta produtoras de insulina do próprio organismo.
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