Má rotação intestinal
Alguns dados sobre a evolução embriológica do intestino
Durante a quarta semana do desenvolvimento do embrião fica delimitada a formação do intestino primitivo1, constituído por 3 segmentos: anterior, médio e posterior.
- O intestino anterior dá origem à faringe2, esôfago3, estômago4, primeira porção do intestino delgado5 (duodeno6), pâncreas7, fígado8 e vesícula biliar9.
- O intestino médio origina o resto do intestino delgado5 (jejuno10 e íleo11) e parte do intestino grosso12 (ceco13, apêndice14, cólon ascendente15 e metade ou 2/3 do cólon transverso16).
- O intestino posterior forma a última porção do intestino grosso12 (metade ou o terço distal17 do cólon transverso16, cólon descendente18, sigmoide19, reto20 e a porção superior do canal anal21).
Estirado em toda sua extensão, o intestino mede cerca de 580 centímetros (5,8 metros), mas porque ele é dobrado e “enrugado”, consegue ser alojado num pequeno espaço dentro do abdômen. Quando em desenvolvimento, ainda no feto22, o que virá a ser o intestino é apenas um pequeno tubo, distendido entre o estômago4 e o reto20 (parte terminal do intestino grosso12). Grande parte deste desenvolvimento ocorre fora da cavidade abdominal23, no que se usa chamar hérnia fisiológica24.
À medida que vai se diferenciando em órgãos separados, o intestino se liga ao cordão umbilical25, que o supre de nutrientes e se desenvolve fora do abdômen. Ao final do terceiro mês de gravidez26, o intestino se move de volta para o interior do abdômen, sofre uma rotação de 270 graus e o mesentério27 produz a fixação das vísceras à parede posterior do abdome28.
Entretanto, esse processo evolutivo pode não se dar de maneira normal e ocorrer uma rotação defeituosa, com as alças intestinais ficando em posições anômalas.
Leia sobre "Sangue29 nas fezes do bebê", "Volvo intestinal30" e "Íleo paralítico31".
O que é má rotação intestinal?
A má rotação intestinal é uma anomalia congênita32 do intestino que conduz a uma disposição anormal das alças intestinais na cavidade abdominal, decorrente de uma falha parcial ou completa nas etapas embriológicas do processo de desenvolvimento do intestino médio (herniação33, rotação e fixação). Ela pode se apresentar como não rotação, rotação incompleta ou rotação reversa (em sentido contrário ao normal) do intestino.
Uma diferenciação deve ser feita entre a má rotação intestinal simples, que acontece enquanto o feto22 está em desenvolvimento no útero34, e o volvo (torção35 de uma alça do intestino ao redor de seu ponto de fixação mesentérica36), que é uma complicação da má rotação que ocorre quando o intestino se contorce de maneira a impedir o fluxo sanguíneo normal para uma de suas partes.
A má rotação intestinal incide em 0,2-1% da população e é sintomática37 em 1 ou 2 de 500 a 6.000 casos. Em 30-60% dos casos, associa-se a outras malformações38 e enfermidades intestinais ou não.
Quais são as características clínicas da má rotação intestinal?
A má rotação intestinal significa que o intestino médio está deslocado em relação à sua posição normal e isso pode causar obstrução intestinal. A má rotação pode aparecer associada a enfermidades como:
- atresia39 intestinal;
- divertículo40 de Meckel;
- intussuscepção;
- doença de Hirschsprung;
- cisto mesentérico41;
- anomalias das vias biliares extra-hepáticas42;
- doença cardíaca congênita32;
- hérnia43 diafragmática congênita32;
- e defeitos da parede abdominal44.
Algumas crianças com má rotação intestinal nunca têm problemas e a condição passa sem ser diagnosticada. Contudo, a maioria delas desenvolve sintomas45 ainda no primeiro ano de vida. Os sinais46 e sintomas45 mais comuns e frequentes na má rotação intestinal são:
- vômitos biliares47 de conteúdo amarelo-esverdeado;
- dores abdominais;
- distensão abdominal;
- frequências cardíaca e respiratória aumentadas;
- presença de sangue29 nas fezes;
- e desnutrição48.
Como o médico diagnostica a má rotação intestinal?
O diagnóstico49 pré-natal de má rotação intestinal é difícil e geralmente só é feito por observação ultrassonográfica de complicações do volvo intestinal30 decorrente da má rotação. Após o nascimento, o diagnóstico49 pode ser feito a partir dos sintomas45 e ser corroborado por exames de imagens.
O sintoma50-chave é o vômito51 bilioso e, em geral, o primeiro exame a ser pedido é a radiografia simples de abdome28, em que se observa sinais46 de obstrução intestinal, seguida por radiografia contrastada gastrointestinal para avaliar a posição da junção duodeno6-jejunal. Essas radiografias abdominais podem demonstrar sinais46 de obstrução intestinal, com dilatação da parte proximal52 do duodeno6 e do estômago4.
A ultrassonografia53 abdominal tem sensibilidade e especificidade inferiores aos exames previamente citados. Nos casos de neonatos54 com história de vômitos55 biliosos e quadro de peritonite56, após as medidas iniciais, uma laparotomia57 exploratória pode ser realizada para diagnóstico49 e tratamento, mesmo sem diagnóstico49 radiológico.
Como o médico trata a má rotação intestinal?
Ao serem diagnosticados com má rotação intestinal, os pacientes devem ser levados a tratamento cirúrgico, devido ao alto risco da doença: o volvo do intestino médio (condição bastante frequente) tem um potencial risco de vida.
A laparoscopia58 tem sido utilizada em pacientes estáveis, enquanto a técnica aberta é preferida quando há volvo e suas complicações. Entretanto, a indicação de tratamento em pacientes assintomáticos permanece controversa.
A apendicectomia profilática é frequentemente considerada, uma vez que mais tarde na vida pode ocorrer um diagnóstico49 tardio difícil de apendicite59, devido à falta de conhecimento de que o paciente tem um ceco13/apêndice14 do lado esquerdo.
Como evolui a má rotação intestinal?
Embora uma cirurgia possa ser necessária para reparar a má rotação e corrigir seus efeitos, a maioria das crianças cresce e se desenvolve normalmente após o tratamento. A má rotação intestinal, quando complicada por um volvo intestinal30, representa uma ameaça de vida e é considerada uma emergência60 médica, requerendo uma cirurgia de urgência61.
Quais são as complicações possíveis com a má rotação intestinal?
A má rotação pode levar às seguintes complicações:
- Ao volvo, em que o intestino torce sobre si mesmo, cortando o fluxo sanguíneo para o tecido62 e fazendo com que o tecido62 morra.
- Podem se formar bandas de tecido62, chamadas bandas de Ladd, obstruindo a primeira parte do intestino delgado5.
- O intestino pode parar de funcionar e o tecido62 intestinal pode morrer por falta de suprimento sanguíneo se uma obstrução não for reconhecida e tratada.
Veja também sobre "Fecaloma", "Esteatorreia63", "Peritonite56" e "Invaginação intestinal".
Referências:
As informações veiculadas neste texto foram extraídas principalmente dos sites da Johns Hopkins Medicine e da Cleveland Clinic.
As notas acima são dirigidas principalmente aos leigos em medicina e têm por objetivo destacar os aspectos mais relevantes desse assunto e não visam substituir as orientações do médico, que devem ser tidas como superiores a elas. Sendo assim, elas não devem ser utilizadas para autodiagnóstico ou automedicação nem para subsidiar trabalhos que requeiram rigor científico.