Novas perspectivas no tratamento da surdez neurossensorial
Os dois tipos de surdez
Para que se ouça um som é preciso que ele seja captado pelo pavilhão auricular, conduzido através do conduto auditivo (ouvido externo1 e médio) até o tímpano2 e daí em diante se valha de estruturas sensoriais e nervosas (ouvido interno3) que conduzirão o estímulo auditivo até o cérebro4, onde será processado.
A surdez (parcial ou total) que ocorre por impedimento das ondas sonoras chegarem ao tímpano2 é dita surdez condutiva ou de transmissão. Pode ocorrer por acúmulo de cera, infecções5 no canal auditivo, perfuração no tímpano2, entre outros fatores. Geralmente, a perda auditiva condutiva é temporária, mas precisa de atendimento para evitar que se torne irreversível. Essa disfunção temporária é passível de ser tratada com medicação e/ou cirurgia, conforme o caso.
A surdez que ocorre por impedimentos do estímulo auditivo chegar ao cérebro4 é dita surdez neurossensorial, estando livres as vias anteriores de condução. Mais comumente a surdez neurossensorial (parcial ou total) ocorre quando as células6 ciliadas da cóclea (células nervosas7) estão diminuídas ou danificadas, como ocorre no envelhecimento, por exemplo. Entretanto, não é apenas a idade que desencadeia a perda auditiva neurossensorial, mas também ficar exposto a sons e ruídos muito altos, por longos períodos de tempo, além de doenças, como caxumba8, rubéola9, meningite10, doença de Ménière, uso constante de alguns medicamentos e fatores genéticos.
Infelizmente, este tipo de perda auditiva não tem cura, embora seja um dos tipos mais comuns de perda auditiva. Entretanto, o uso de aparelhos auditivos e mais recentemente o implante11 coclear são uma solução para quem sofre com o problema.
Saiba mais sobre "Surdez", "Cera no ouvido", "Perfuração do tímpano2", "Doença de Ménière" e "Implante11 coclear".
O que vem sendo feito no tratamento da surdez neurossensorial?
Tradicionalmente, a surdez neurossensorial não tem cura e não pode ser resolvida de forma definitiva através das ferramentas de que a medicina hoje dispõe. Para esses casos, os aparelhos e implantes auditivos são as soluções tecnológicas disponíveis. Esses dispositivos revolucionaram a realidade dos deficientes auditivos, permitindo que muitos deles passassem a levar uma vida totalmente integrada à sociedade ouvinte e ao mundo dos sons.
Entretanto, alguns desafios relacionados à qualidade da audição através dessas tecnologias ainda permanecem: demandas auditivas mais elaboradas como, por exemplo, compreender a fala em ambientes barulhentos, ouvir música, aprender uma segunda língua12, etc., dependem de um esforço além do normal e se tornam cansativos e, algumas vezes, frustrantes. Quando estão sem seus aparelhos, no banho ou dormindo, por exemplo, esses deficientes voltam à realidade do silêncio. Dadas essas e outras dificuldades, os pacientes muito se beneficiariam com um tratamento curativo para a surdez neurossensorial.
Estimulados por essa expectativa mundial, um número considerável de pesquisadores vem trabalhando em diversas universidades ao redor do mundo em busca de um tratamento curativo para a surdez. No início de outubro de 2019, a The New York Academy of Sciences promoveu o “Simpósio de Restauração Auditiva e Regeneração das Células6 Auditivas”, que reuniu pesquisadores, médicos, audiologistas, farmacêuticos e biólogos de ponta, com o objetivo de comunicar e incentivar as pesquisas que têm sido feitas no terreno da surdez neurossensorial.
Bastante simplificadamente, é nas células6 ciliadas que reside a barreira que ainda impede a restauração da audição nos casos da surdez do tipo neurossensorial em humanos. Na prática, são elas que representam o ponto de comunicação entre o meio externo e interno do ouvido. As pesquisas em andamento partem da análise comparativa entre diferentes espécies de animais e seres humanos. Enquanto nos pássaros, por exemplo, as células6 ciliares do ouvido são capazes de se regenerar, as do ouvido humano carecem dessa capacidade. Nos peixes, essas células6 se situam na sua superfície corporal e essa localização privilegiada permite aos cientistas analisá-las em pleno funcionamento, com o animal vivo. As pesquisas com esses animais têm ajudado a compreender quais genes e substâncias devem estar envolvidos numa possível regeneração de células6 ciliares humanas.
Alguns outros avanços têm sido feitos no campo da genética. Durante o simpósio, três pesquisadores apresentaram trabalhos ligados aos genes onde ocorrem as mutações causadoras da surdez neurossensorial. Na prática, já foi possível reverter a surdez de ratos portadores das mutações anômalas. Os pesquisadores estimaram que as primeiras soluções com base na engenharia genética devem estar disponíveis em cerca de dois anos.
Na primeira fase do estudo das células-tronco13 em humanos, houve uma melhora significativa dos limiares auditivos em 4 dos 15 pacientes testados. Apesar do resultado parecer modesto, torna-se grandioso quando se constata que foi a primeira vez que se conseguiu restaurar a surdez neurossensorial em humanos, ainda que parcialmente. A expectativa é que novas aplicações de células-tronco13 possam trazer um resultado mais expressivo. Estudos também têm sido feitos com células6 progenitoras, menos poderosas que a células-tronco13 totipotentes14, mas que também podem ser diferenciadas e transformadas em células6 ciliares. Essa talvez seja a tecnologia mais próxima de se tornar realidade.
No final do certame, ficou um sentimento de justificada esperança de que o avanço da ciência e da tecnologia chegarão a resultados positivos nesse terreno. A cura da surdez neurossensorial parece ser questão de tempo. Um dos estudiosos afirmou: “Não é uma questão se vamos conseguir regenerar as células6 ciliadas auditivas, e sim quando isso vai acontecer”.
Leia também sobre "Zumbido no ouvido15 ou tinnitus16", "Protetores auditivos", "Surdez em idosos e risco de demência17" e "Audiometria18".
Referências:
As informações veiculadas neste texto foram extraídas do site Portal Otorrino – Dr. Luciano Moreira, RJ e de comunicações pessoais do Dr. Luciano Moreira.
As notas acima são dirigidas principalmente aos leigos em medicina e têm por objetivo destacar os aspectos mais relevantes desse assunto e não visam substituir as orientações do médico, que devem ser tidas como superiores a elas. Sendo assim, elas não devem ser utilizadas para autodiagnóstico ou automedicação nem para subsidiar trabalhos que requeiram rigor científico.