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Sanfilippo: quando a infância enfrenta a neurodegeneração

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O que é a síndrome1 de Sanfilippo?

A síndrome1 de Sanfilippo, também conhecida como mucopolissacaridose tipo III (MPS III), é frequentemente chamada de "Alzheimer2 infantil", embora sejam condições distintas. Enquanto o Alzheimer2 é uma doença neurodegenerativa típica de adultos, relacionada ao acúmulo de placas3 amiloides, a síndrome1 de Sanfilippo é uma doença lisossômica de depósito do grupo das mucopolissacaridoses.

A semelhança entre ambas reside na perda progressiva de memória e de habilidades cognitivas e motoras, e no declínio neurológico que leva à demência4, com impacto devastador na qualidade de vida. No entanto, a síndrome1 de Sanfilippo afeta predominantemente crianças, geralmente entre 2 e 6 anos de idade, ao passo que o Alzheimer2 ocorre tipicamente em idosos.

A MPS III é dividida em quatro subtipos (MPS IIIA, IIIB, IIIC e IIID), dependendo da enzima5 específica afetada. A síndrome1 foi descrita pela primeira vez em 1963 pelo pediatra norte-americano Sylvester Sanfilippo.

Quais são as causas da síndrome1 de Sanfilippo?

A síndrome1 de Sanfilippo é uma doença genética de herança autossômica6 recessiva, causada por mutações em genes que codificam enzimas responsáveis pela degradação do sulfato de heparan, um tipo de glicosaminoglicano. As enzimas afetadas variam de acordo com o subtipo:

  • MPS IIIA – deficiência de heparan N-sulfatase (gene SGSH)
  • MPS IIIB – deficiência de alfa-N-acetilglicosaminidase (gene NAGLU)
  • MPS IIIC – deficiência de acetil-CoA:alfa-glicosaminida N-acetiltransferase (gene HGSNAT)
  • MPS IIID – deficiência de N-acetilglicosamina-6-sulfatase (gene GNS)

Essas mutações resultam na acumulação de sulfato de heparan nos lisossomos, principalmente no sistema nervoso central7, levando à disfunção celular progressiva.

Veja mais sobre "Demência4", "Doenças nervosas degenerativas8" e "Quando a perda de memória não é normal".

Qual é o substrato fisiopatológico da síndrome1 de Sanfilippo?

A fisiopatologia9 envolve deficiência enzimática lisossômica, com consequente acúmulo de sulfato de heparan não degradado nos lisossomos de diversas células10, especialmente em neurônios11 e células10 da glia. Os lisossomos são organelas citoplasmáticas responsáveis pela degradação e reciclagem intracelular. O acúmulo do substrato causa disfunção lisossômica, que compromete a homeostase celular, o tráfego vesicular, a reciclagem de biomoléculas e desencadeia uma resposta inflamatória crônica no sistema nervoso central7, com ativação da micróglia e liberação de citocinas12 pró-inflamatórias.

A combinação entre acúmulo de sulfato de heparan, neuroinflamação e estresse oxidativo leva à disfunção sináptica, perda neuronal progressiva e atrofia13 cerebral, resultando nos sintomas14 neurológicos característicos da doença, como regressão do desenvolvimento, distúrbios comportamentais e demência4.

Embora o sistema nervoso central7 seja o principal sistema acometido, o envolvimento de outros órgãos pode levar a manifestações periféricas, como dismorfismos faciais leves, hepatoesplenomegalia15 e alterações articulares.

Quais são as características clínicas da síndrome1 de Sanfilippo?

Os sinais16 e sintomas14 variam conforme o subtipo e o estágio da doença, mas incluem:

  • Atraso no desenvolvimento psicomotor17 e da linguagem, perceptível entre 2 e 6 anos.
  • Perda de habilidades previamente adquiridas, dificuldades de aprendizagem e demência4 progressiva.
  • Hiperatividade, impulsividade, agressividade, distúrbios do sono e comportamentos do espectro autista.
  • Discreta dismorfia18 facial: sobrancelhas19 espessas, nariz20 largo, lábios grossos.
  • Convulsões, rigidez muscular e dificuldades motoras na infância tardia.
  • Infecções21 respiratórias de repetição, como sinusites e otites22.
  • Hepatoesplenomegalia15, detectável ao exame físico.
  • Leve rigidez articular, alterações esqueléticas e baixa estatura.
  • Surdez parcial ou progressiva, especialmente nos estágios mais avançados.
  • Diarreia23 crônica e dificuldades alimentares.

A progressão clínica é mais rápida nos subtipos A e B.

Como o médico diagnostica a síndrome1 de Sanfilippo?

O diagnóstico24 combina avaliação clínica, testes laboratoriais e confirmação genética. A suspeita clínica baseia-se em sinais16 como atraso do desenvolvimento, alterações comportamentais, perda de habilidades cognitivas, dismorfismos faciais leves e hepatoesplenomegalia15.

Os exames iniciais incluem:

  • Dosagem de mucopolissacarídeos urinários: níveis elevados de sulfato de heparan são sugestivos.
  • Atividade enzimática específica: medida em leucócitos25 ou fibroblastos26 de cultura.
  • Testes genéticos: confirmam a mutação27 no gene específico e definem o subtipo.
  • Ressonância magnética28 cerebral: pode evidenciar atrofia13 cortical e alterações da substância branca.
  • Avaliações neuropsicológicas e audiológicas: auxiliam na monitorização da progressão da doença.

Como o médico trata a síndrome1 de Sanfilippo?

Atualmente, não há cura para a síndrome1 de Sanfilippo, e o tratamento é essencialmente sintomático29 e voltado ao suporte multiprofissional. O objetivo é retardar a progressão da doença, preservar a qualidade de vida e minimizar as complicações.

Terapias de reabilitação como fonoaudiologia, fisioterapia30, terapia ocupacional31 e acompanhamento psicopedagógico são fundamentais para estimular o desenvolvimento de habilidades cognitivas, motoras e de comunicação. Medicamentos podem ser utilizados para controle de sintomas14 específicos, como anticonvulsivantes para crises epilépticas, melatonina ou outros fármacos para distúrbios do sono e psicotrópicos32 para manejo de comportamentos agressivos ou de agitação.

Além disso, é importante o controle das infecções21 respiratórias de repetição e o suporte nutricional, especialmente nos casos com disfagia33 ou dificuldades alimentares. O acompanhamento deve ser contínuo, com reavaliações periódicas e intervenções ajustadas conforme a evolução clínica.

Por fim, aconselhamento genético é imprescindível para os familiares, tanto para compreensão da herança da doença quanto para planejamento reprodutivo.

Como evolui a síndrome1 de Sanfilippo?

A evolução é progressiva, com declínio neurológico constante. A expectativa de vida34 varia entre a adolescência e o início da vida adulta, e a causa mais comum de óbito35 são complicações neurológicas ou respiratórias.

Leia sobre "Aconselhamento genético", "Exame genético" e "Transtornos do espectro autista".

 

Referências:

As informações veiculadas neste texto foram extraídas principalmente dos sites da Cleveland Clinic e da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

ABCMED, 2025. Sanfilippo: quando a infância enfrenta a neurodegeneração. Disponível em: <https://www.abc.med.br/p/sinais.-sintomas-e-doencas/1491025/sanfilippo-quando-a-infancia-enfrenta-a-neurodegeneracao.htm>. Acesso em: 18 jun. 2025.
Nota ao leitor:
As notas acima são dirigidas principalmente aos leigos em medicina e têm por objetivo destacar os aspectos mais relevantes desse assunto e não visam substituir as orientações do médico, que devem ser tidas como superiores a elas. Sendo assim, elas não devem ser utilizadas para autodiagnóstico ou automedicação nem para subsidiar trabalhos que requeiram rigor científico.

Complementos

1 Síndrome: Conjunto de sinais e sintomas que se encontram associados a uma entidade conhecida ou não.
2 Alzheimer: Doença degenerativa crônica que produz uma deterioração insidiosa e progressiva das funções intelectuais superiores. É uma das causas mais freqüentes de demência. Geralmente começa a partir dos 50 anos de idade e tem incidência similar entre homens e mulheres.
3 Placas: 1. Lesões achatadas, semelhantes à pápula, mas com diâmetro superior a um centímetro. 2. Folha de material resistente (metal, vidro, plástico etc.), mais ou menos espessa. 3. Objeto com formato de tabuleta, geralmente de bronze, mármore ou granito, com inscrição comemorativa ou indicativa. 4. Chapa que serve de suporte a um aparelho de iluminação que se fixa em uma superfície vertical ou sobre uma peça de mobiliário, etc. 5. Placa de metal que, colocada na dianteira e na traseira de um veículo automotor, registra o número de licenciamento do veículo. 6. Chapa que, emitida pela administração pública, representa sinal oficial de concessão de certas licenças e autorizações. 7. Lâmina metálica, polida, usualmente como forma em processos de gravura. 8. Área ou zona que difere do resto de uma superfície, ordinariamente pela cor. 9. Mancha mais ou menos espessa na pele, como resultado de doença, escoriação, etc. 10. Em anatomia geral, estrutura ou órgão chato e em forma de placa, como uma escama ou lamela. 11. Em informática, suporte plano, retangular, de fibra de vidro, em que se gravam chips e outros componentes eletrônicos do computador. 12. Em odontologia, camada aderente de bactérias que se forma nos dentes.
4 Demência: Deterioração irreversível e crônica das funções intelectuais de uma pessoa.
5 Enzima: Proteína produzida pelo organismo que gera uma reação química. Por exemplo, as enzimas produzidas pelo intestino que ajudam no processo digestivo.
6 Autossômica: 1. Referente a autossomo, ou seja, ao cromossomo que não participa da determinação do sexo; eucromossomo. 2. Cujo gene está localizado em um dos autossomos (diz-se da herança de características). As doenças gênicas podem ser classificadas segundo o seu padrão de herança genética em: autossômica dominante (só basta um alelo afetado para que se manifeste a afecção), autossômica recessiva (são necessários dois alelos com mutação para que se manifeste a afecção), ligada ao cromossomo sexual X e as de herança mitocondrial (necessariamente herdadas da mãe).
7 Sistema Nervoso Central: Principais órgãos processadores de informação do sistema nervoso, compreendendo cérebro, medula espinhal e meninges.
8 Degenerativas: Relativas a ou que provocam degeneração.
9 Fisiopatologia: Estudo do conjunto de alterações fisiológicas que acontecem no organismo e estão associadas a uma doença.
10 Células: Unidades (ou subunidades) funcionais e estruturais fundamentais dos organismos vivos. São compostas de CITOPLASMA (com várias ORGANELAS) e limitadas por uma MEMBRANA CELULAR.
11 Neurônios: Unidades celulares básicas do tecido nervoso. Cada neurônio é formado por corpo, axônio e dendritos. Sua função é receber, conduzir e transmitir impulsos no SISTEMA NERVOSO. Sinônimos: Células Nervosas
12 Citocinas: Citoquina ou citocina é a designação genérica de certas substâncias segregadas por células do sistema imunitário que controlam as reações imunes do organismo.
13 Atrofia: 1. Em biologia, é a falta de desenvolvimento de corpo, órgão, tecido ou membro. 2. Em patologia, é a diminuição de peso e volume de órgão, tecido ou membro por nutrição insuficiente das células ou imobilização. 3. No sentido figurado, é uma debilitação ou perda de alguma faculdade mental ou de um dos sentidos, por exemplo, da memória em idosos.
14 Sintomas: Alterações da percepção normal que uma pessoa tem de seu próprio corpo, do seu metabolismo, de suas sensações, podendo ou não ser um indício de doença. Os sintomas são as queixas relatadas pelo paciente mas que só ele consegue perceber. Sintomas são subjetivos, sujeitos à interpretação pessoal. A variabilidade descritiva dos sintomas varia em função da cultura do indivíduo, assim como da valorização que cada pessoa dá às suas próprias percepções.
15 Hepatoesplenomegalia: Aumento de volume do fígado e do baço.
16 Sinais: São alterações percebidas ou medidas por outra pessoa, geralmente um profissional de saúde, sem o relato ou comunicação do paciente. Por exemplo, uma ferida.
17 Psicomotor: Próprio ou referente a qualquer resposta que envolva aspectos motores e psíquicos, tais como os movimentos corporais governados pela mente.
18 Dismorfia: 1. Em patologia, deformidade ou dismorfia é um defeito de conformação de um órgão ou parte do corpo; também conhecido como disformia, disformidade ou dismorfose. 2. Dismorfia corporal é um transtorno mental que tem como principal sintoma a insatisfação extrema com a imagem corporal. Ela faz com que a pessoa tenha uma visão distorcida do próprio corpo e desenvolva uma aversão à própria imagem.
19 Sobrancelhas: Linhas curvas de cabelos localizadas nas bordas superiores das cavidades orbitárias.
20 Nariz: Estrutura especializada que funciona como um órgão do sentido do olfato e que também pertence ao sistema respiratório; o termo inclui tanto o nariz externo como a cavidade nasal.
21 Infecções: Doença produzida pela invasão de um germe (bactéria, vírus, fungo, etc.) em um organismo superior. Como conseqüência da mesma podem ser produzidas alterações na estrutura ou funcionamento dos tecidos comprometidos, ocasionando febre, queda do estado geral, e inúmeros sintomas que dependem do tipo de germe e da reação imunológica perante o mesmo.
22 Otites: Toda infecção do ouvido é chamada de otite.
23 Diarréia: Aumento do volume, freqüência ou quantidade de líquido nas evacuações.Deve ser a manifestação mais freqüente de alteração da absorção ou transporte intestinal de substâncias, alterações estas que em geral são devidas a uma infecção bacteriana ou viral, a toxinas alimentares, etc.
24 Diagnóstico: Determinação de uma doença a partir dos seus sinais e sintomas.
25 Leucócitos: Células sangüíneas brancas. Compreendem tanto os leucócitos granulócitos (BASÓFILOS, EOSINÓFILOS e NEUTRÓFILOS) como os não granulócitos (LINFÓCITOS e MONÓCITOS). Sinônimos: Células Brancas do Sangue; Corpúsculos Sanguíneos Brancos; Corpúsculos Brancos Sanguíneos; Corpúsculos Brancos do Sangue; Células Sanguíneas Brancas
26 Fibroblastos: Células do tecido conjuntivo que secretam uma matriz extracelular rica em colágeno e outras macromoléculas.
27 Mutação: 1. Ato ou efeito de mudar ou mudar-se. Alteração, modificação, inconstância. Tendência, facilidade para mudar de ideia, atitude etc. 2. Em genética, é uma alteração súbita no genótipo de um indivíduo, sem relação com os ascendentes, mas passível de ser herdada pelos descendentes.
28 Ressonância magnética: Exame que fornece imagens em alta definição dos órgãos internos do corpo através da utilização de um campo magnético.
29 Sintomático: 1. Relativo a ou que constitui sintoma. 2. Que é efeito de alguma doença. 3. Por extensão de sentido, é o que indica um particular estado de coisas, de espírito; revelador, significativo.
30 Fisioterapia: Especialidade paramédica que emprega agentes físicos (água doce ou salgada, sol, calor, eletricidade, etc.), massagens e exercícios no tratamento de doenças.
31 Terapia ocupacional: A terapia ocupacional trabalha com a reabilitação das pessoas para as atividades que elas deixaram de fazer devido a algum problema físico (derrame, amputação, tetraplegia), psiquiátrico (esquizofrenia, depressão), mental (Síndrome de Down, autismo), geriátrico (Doença de Alzheimer, Doença de Parkinson) ou social (ex-presidiários, moradores de rua), objetivando melhorar a qualidade de vida dessas pessoas. Além disso, ela faz a organização e as adaptações do domicílio para facilitar o trânsito dessa pessoa e as medidas preventivas para impedir o aparecimento de deformidades nos braços fazendo exercícios e confeccionando órteses (aparelhos confeccionados sob medida para posicionar partes do corpo).
32 Psicotrópicos: Que ou o que atua quimicamente sobre o psiquismo, a atividade mental, o comportamento, a percepção, etc. (diz-se de medicamento, droga, substância, etc.). Alguns psicotrópicos têm efeito sedativo, calmante ou antidepressivo; outros, especialmente se usados indevidamente, podem causar perturbações psíquicas.
33 Disfagia: Sensação consciente da passagem dos alimentos através do esôfago. Pode estar associado a doenças motoras, inflamatórias ou tumorais deste órgão.
34 Expectativa de vida: A expectativa de vida ao nascer é o número de anos que se calcula que um recém-nascido pode viver caso as taxas de mortalidade registradas da população residente, no ano de seu nascimento, permaneçam as mesmas ao longo de sua vida.
35 Óbito: Morte de pessoa; passamento, falecimento.

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