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Microangiopatias trombóticas: quando pequenos coágulos causam grandes estragos

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O que são microangiopatias trombóticas1?

As microangiopatias trombóticas1 (MATs) constituem um conjunto de doenças caracterizadas por anemia hemolítica2 microangiopática, trombocitopenia3 e formação de trombos4 em vasos de pequeno calibre (capilares5 e arteríolas6), com potencial para isquemia7 e dano orgânico.

Apesar de raras, são condições potencialmente fatais que exigem reconhecimento e tratamento imediatos. As formas de maior importância clínica são a púrpura8 trombocitopênica trombótica9 (PTT) e a síndrome10 hemolítico-urêmica (SHU), mas há também outras formas menos frequentes ou secundárias.

Quais são as causas das microangiopatias trombóticas1?

As causas variam com o subtipo. Na PTT, há deficiência da enzima11 ADAMTS13 (hereditária ou, mais frequentemente, adquirida por autoanticorpos anti-ADAMTS13) levando ao acúmulo de multímeros ultragrandes do fator de von Willebrand e à formação de trombos4 microvasculares.

Na SHU típica, o quadro decorre sobretudo de infecção12 por Escherichia coli produtora de toxina13 Shiga, com dano endotelial predominantemente renal14. Já na SHU atípica, o problema é a desregulação do sistema complemento, geralmente por variantes genéticas ou autoanticorpos.

Em MATs secundárias, fármacos (ex.: inibidores de VEGF, quimioterápicos e imunotoxinas), infecções15 virais e condições autoimunes16 podem atuar como gatilhos.

Veja sobre "Hemograma", "Coagulograma", "Coagulação17 sanguínea" e "Hemorragias18".

Qual é o substrato fisiopatológico das microangiopatias trombóticas1?

O evento central é a lesão19 endotelial difusa, com perda da tromborresistência, ativação plaquetária e formação de trombos4 intravasculares20, culminando em isquemia7 tecidual e fragmentação de eritrócitos21.

O acúmulo de multímeros ultragrandes do fator de von Willebrand, devido à deficiência de ADAMTS13, contribui para a trombose22 microvascular. A disfunção endotelial associa-se à redução de prostaciclina e óxido nítrico, o que aumenta a vasoconstrição23 e favorece a trombose22.

Na SHU típica, a toxina13 Shiga é citotóxica para o endotélio24 glomerular, promovendo edema25, descolamento endotelial e deposição subendotelial com microtrombose.

Quais são as características clínicas das microangiopatias trombóticas1?

A apresentação costuma ser súbita, com anemia hemolítica2 microangiopática e trombocitopenia3 associadas à disfunção de órgão-alvo. A “pêntade clássica” (febre26, hemólise27, trombocitopenia3, lesão19 renal14 e sinais28 neurológicos) é hoje incompleta na maioria dos casos; o mais útil é reconhecer a tríade hemólise27 microangiopática + plaquetopenia29 + lesão19 de órgão.

Manifestações neurológicas predominam na PTT, variando de cefaleia30 e confusão a convulsões e AVC. Na SHU, o acometimento renal14 é mais proeminente, com elevação de creatinina31 e possível hipertensão arterial32. Diarreia33 com sangue34 pode preceder a SHU por toxina13 Shiga.

Como o médico diagnostica as microangiopatias trombóticas1?

O diagnóstico35 é clínico-laboratorial e urgente. Confirmam-se hemólise27 microangiopática com esquistócitos no esfregaço, LDH elevado, bilirrubina36 indireta aumentada e haptoglobina reduzida, geralmente com teste de Coombs direto negativo; documenta-se trombocitopenia3 e avalia-se função renal14.

A dosagem da atividade de ADAMTS13 (≤10% sugere fortemente PTT adquirida) e a investigação do sistema complemento ajudam a definir a etiologia37, mas não devem retardar o início do tratamento. Na suspeita de SHU típica, a pesquisa de toxina13 Shiga em fezes é útil. Exames de imagem e avaliação de órgão-alvo são dirigidos pela apresentação clínica.

Como o médico trata as microangiopatias trombóticas1?

O tratamento deve começar assim que houver suspeita, antes da confirmação etiológica. Na PTT, a troca plasmática diária (plasmaférese) combinada a corticosteroides sistêmicos38 é o pilar terapêutico. Caplacizumabe (anti-vWF) reduz tempo de trombose22 e recidivas39, e rituximabe é útil especialmente nas formas autoimunes16 ou recorrentes.

Na SHU típica por toxina13 Shiga, a base é suporte intensivo (hidratação, controle pressórico e diálise40 quando necessário). Antibióticos e antidiarreicos que diminuem a motilidade podem piorar a liberação de toxina13 e são, em geral, evitados. Na SHU atípica, o bloqueio do sistema complemento com eculizumabe ou ravulizumabe é altamente eficaz.

Em MATs secundárias, suspende-se o agente causal e trata-se a doença de base. Plasmaférese ou bloqueio do sistema complemento podem ser considerados conforme o mecanismo. 

Quais são as complicações possíveis com as microangiopatias trombóticas1?

Sem tratamento rápido, podem ocorrer falência de múltiplos órgãos e óbito41. Na SHU, a lesão19 renal14 aguda pode evoluir para doença renal14 crônica. Na PTT, complicações neurológicas, incluindo convulsões e AVC, são mais comuns.

Recorrências42 podem acontecer, sobretudo na PTT autoimune43 e na SHU atípica, motivo pelo qual é fundamental seguimento especializado (hematologia / nefrologia), educação do paciente para reconhecer sinais28 de alerta e monitorização laboratorial periódica.

Leia também sobre "Esplenectomia ou retirada do baço44", "Púrpura8" e "Insuficiência renal45 aguda".

 

ABCMED, 2025. Microangiopatias trombóticas: quando pequenos coágulos causam grandes estragos. Disponível em: <https://www.abc.med.br/p/sinais.-sintomas-e-doencas/1496095/microangiopatias-tromboticas-quando-pequenos-coagulos-causam-grandes-estragos.htm>. Acesso em: 10 out. 2025.
Nota ao leitor:
As notas acima são dirigidas principalmente aos leigos em medicina e têm por objetivo destacar os aspectos mais relevantes desse assunto e não visam substituir as orientações do médico, que devem ser tidas como superiores a elas. Sendo assim, elas não devem ser utilizadas para autodiagnóstico ou automedicação nem para subsidiar trabalhos que requeiram rigor científico.

Complementos

1 Trombóticas: Relativo à trombose, ou seja, à formação ou desenvolvimento de um trombo (coágulo).
2 Anemia hemolítica: Doença hereditária que faz com que os glóbulos vermelhos do sangue se desintegrem no interior dos veios sangüíneos (hemólise intravascular) ou em outro lugar do organismo (hemólise extravascular). Pode ter várias causas e ser congênita ou adquirida. O tratamento depende da causa.
3 Trombocitopenia: É a redução do número de plaquetas no sangue. Contrário de trombocitose. Quando a quantidade de plaquetas no sangue é inferior a 150.000/mm³, diz-se que o indivíduo apresenta trombocitopenia (ou plaquetopenia). As pessoas com trombocitopenia apresentam tendência de sofrer hemorragias.
4 Trombos: Coágulo aderido à parede interna de uma veia ou artéria. Pode ocasionar a diminuição parcial ou total da luz do mesmo com sintomas de isquemia.
5 Capilares: Minúsculos vasos que conectam as arteríolas e vênulas.
6 Arteríolas: As menores ramificações das artérias. Estão localizadas entre as artérias musculares e os capilares.
7 Isquemia: Insuficiência absoluta ou relativa de aporte sanguíneo a um ou vários tecidos. Suas manifestações dependem do tecido comprometido, sendo a mais frequente a isquemia cardíaca, capaz de produzir infartos, isquemia cerebral, produtora de acidentes vasculares cerebrais, etc.
8 Púrpura: Lesão hemorrágica de cor vinhosa, que não desaparece à pressão, com diâmetro superior a um centímetro.
9 Trombótica: Relativo à trombose, ou seja, à formação ou desenvolvimento de um trombo (coágulo).
10 Síndrome: Conjunto de sinais e sintomas que se encontram associados a uma entidade conhecida ou não.
11 Enzima: Proteína produzida pelo organismo que gera uma reação química. Por exemplo, as enzimas produzidas pelo intestino que ajudam no processo digestivo.
12 Infecção: Doença produzida pela invasão de um germe (bactéria, vírus, fungo, etc.) em um organismo superior. Como conseqüência da mesma podem ser produzidas alterações na estrutura ou funcionamento dos tecidos comprometidos, ocasionando febre, queda do estado geral, e inúmeros sintomas que dependem do tipo de germe e da reação imunológica perante o mesmo.
13 Toxina: Substância tóxica, especialmente uma proteína, produzida durante o metabolismo e o crescimento de certos microrganismos, animais e plantas, capaz de provocar a formação de anticorpos ou antitoxinas.
14 Renal: Relacionado aos rins. Uma doença renal é uma doença dos rins. Insuficiência renal significa que os rins pararam de funcionar.
15 Infecções: Doença produzida pela invasão de um germe (bactéria, vírus, fungo, etc.) em um organismo superior. Como conseqüência da mesma podem ser produzidas alterações na estrutura ou funcionamento dos tecidos comprometidos, ocasionando febre, queda do estado geral, e inúmeros sintomas que dependem do tipo de germe e da reação imunológica perante o mesmo.
16 Autoimunes: 1. Relativo à autoimunidade (estado patológico de um organismo atingido por suas próprias defesas imunitárias). 2. Produzido por autoimunidade. 3. Autoalergia.
17 Coagulação: Ato ou efeito de coagular(-se), passando do estado líquido ao sólido.
18 Hemorragias: Saída de sangue dos vasos sanguíneos ou do coração para o exterior, para o interstício ou para cavidades pré-formadas do organismo.
19 Lesão: 1. Ato ou efeito de lesar (-se). 2. Em medicina, ferimento ou traumatismo. 3. Em patologia, qualquer alteração patológica ou traumática de um tecido, especialmente quando acarreta perda de função de uma parte do corpo. Ou também, um dos pontos de manifestação de uma doença sistêmica. 4. Em termos jurídicos, prejuízo sofrido por uma das partes contratantes que dá mais do que recebe, em virtude de erros de apreciação ou devido a elementos circunstanciais. Ou também, em direito penal, ofensa, dano à integridade física de alguém.
20 Intravasculares: Relativos ao interior dos vasos sanguíneos e linfáticos, ou que ali se situam ou ocorrem.
21 Eritrócitos: Células vermelhas do sangue. Os eritrócitos maduros são anucleados, têm forma de disco bicôncavo e contêm HEMOGLOBINA, cuja função é transportar OXIGÊNIO. Sinônimos: Corpúsculos Sanguíneos Vermelhos; Corpúsculos Vermelhos Sanguíneos; Corpúsculos Vermelhos do Sangue; Glóbulos Vermelhos; Hemácias
22 Trombose: Formação de trombos no interior de um vaso sanguíneo. Pode ser venosa ou arterial e produz diferentes sintomas segundo os territórios afetados. A trombose de uma artéria coronariana pode produzir um infarto do miocárdio.
23 Vasoconstrição: Diminuição do diâmetro dos vasos sanguíneos.
24 Endotélio: Camada de células que reveste interiormente os vasos sanguíneos e os vasos linfáticos.
25 Edema: 1. Inchaço causado pelo excesso de fluidos no organismo. 2. Acúmulo anormal de líquido nos tecidos do organismo, especialmente no tecido conjuntivo.
26 Febre: É a elevação da temperatura do corpo acima dos valores normais para o indivíduo. São aceitos como valores de referência indicativos de febre: temperatura axilar ou oral acima de 37,5°C e temperatura retal acima de 38°C. A febre é uma reação do corpo contra patógenos.
27 Hemólise: Alteração fisiológica ou patológica, com dissolução ou destruição dos glóbulos vermelhos do sangue causando liberação de hemoglobina. É também conhecida por hematólise, eritrocitólise ou eritrólise. Pode ser produzida por algumas anemias congênitas ou adquiridas, como consequência de doenças imunológicas, etc.
28 Sinais: São alterações percebidas ou medidas por outra pessoa, geralmente um profissional de saúde, sem o relato ou comunicação do paciente. Por exemplo, uma ferida.
29 Plaquetopenia: Plaquetopenia ou trombocitopenia é a diminuição do número de plaquetas (trombócitos) que participam na coagulação. Habitualmente o sangue contém de 150.000 a 350.000 plaquetas por microlitro. Muitas doenças podem reduzir o número de plaquetas, as principais causas são uma produção insuficiente na medula óssea, o sequestro das plaquetas por um baço grande, o aumento do uso dos trombócitos, da sua destruição ou a sua diluição no sangue.
30 Cefaleia: Sinônimo de dor de cabeça. Este termo engloba todas as dores de cabeça existentes, ou seja, enxaqueca ou migrânea, cefaleia ou dor de cabeça tensional, cefaleia cervicogênica, cefaleia em pontada, cefaleia secundária a sinusite, etc... são tipos dentro do grupo das cefaleias ou dores de cabeça. A cefaleia tipo tensional é a mais comum (acomete 78% da população), seguida da enxaqueca ou migrânea (16% da população).
31 Creatinina: Produto residual das proteínas da dieta e dos músculos do corpo. É excretada do organismo pelos rins. Uma vez que as doenças renais progridem, o nível de creatinina aumenta no sangue.
32 Hipertensão arterial: Aumento dos valores de pressão arterial acima dos valores considerados normais, que no adulto são de 140 milímetros de mercúrio de pressão sistólica e 85 milímetros de pressão diastólica.
33 Diarréia: Aumento do volume, freqüência ou quantidade de líquido nas evacuações.Deve ser a manifestação mais freqüente de alteração da absorção ou transporte intestinal de substâncias, alterações estas que em geral são devidas a uma infecção bacteriana ou viral, a toxinas alimentares, etc.
34 Sangue: O sangue é uma substância líquida que circula pelas artérias e veias do organismo. Em um adulto sadio, cerca de 45% do volume de seu sangue é composto por células (a maioria glóbulos vermelhos, glóbulos brancos e plaquetas). O sangue é vermelho brilhante, quando oxigenado nos pulmões (nos alvéolos pulmonares). Ele adquire uma tonalidade mais azulada, quando perde seu oxigênio, através das veias e dos pequenos vasos denominados capilares.
35 Diagnóstico: Determinação de uma doença a partir dos seus sinais e sintomas.
36 Bilirrubina: Pigmento amarelo que é produto da degradação da hemoglobina. Quando aumenta no sangue, acima de seus valores normais, pode produzir uma coloração amarelada da pele e mucosas, denominada icterícia. Pode estar aumentado no sangue devido a aumento da produção do mesmo (excesso de degradação de hemoglobina) ou por dificuldade de escoamento normal (por exemplo, cálculos biliares, hepatite).
37 Etiologia: 1. Ramo do conhecimento cujo objeto é a pesquisa e a determinação das causas e origens de um determinado fenômeno. 2. Estudo das causas das doenças.
38 Sistêmicos: 1. Relativo a sistema ou a sistemática. 2. Relativo à visão conspectiva, estrutural de um sistema; que se refere ou segue um sistema em seu conjunto. 3. Disposto de modo ordenado, metódico, coerente. 4. Em medicina, é o que envolve o organismo como um todo ou em grande parte.
39 Recidivas: 1. Em medicina, é o reaparecimento de uma doença ou de um sintoma, após período de cura mais ou menos longo; recorrência. 2. Em direito penal, significa recaída na mesma falta, no mesmo crime; reincidência.
40 Diálise: Quando os rins estão muito doentes, eles deixam de realizar suas funções, o que pode levar a risco de vida. Nesta situação, é preciso substituir as funções dos rins de alguma maneira, o que pode ser feito realizando-se um transplante renal, ou através da diálise. A diálise é um tipo de tratamento que visa repor as funções dos rins, retirando as substâncias tóxicas e o excesso de água e sais minerais do organismo, estabelecendo assim uma nova situação de equilíbrio. Existem dois tipos de diálise: a hemodiálise e a diálise peritoneal.
41 Óbito: Morte de pessoa; passamento, falecimento.
42 Recorrências: 1. Retornos, repetições. 2. Em medicina, é o reaparecimento dos sintomas característicos de uma doença, após a sua completa remissão. 3. Em informática, é a repetição continuada da mesma operação ou grupo de operações. 4. Em psicologia, é a volta à memória.
43 Autoimune: 1. Relativo à autoimunidade (estado patológico de um organismo atingido por suas próprias defesas imunitárias). 2. Produzido por autoimunidade. 3. Autoalergia.
44 Baço:
45 Insuficiência renal: Condição crônica na qual o corpo retém líquido e excretas pois os rins não são mais capazes de trabalhar apropriadamente. Uma pessoa com insuficiência renal necessita de diálise ou transplante renal.
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