Polifarmácia: conceito, riscos, identificação e manejo
O que é polifarmácia?
Mesmo não havendo consenso na literatura sobre a definição dessa prática, deve-se entendê-la como o uso concomitante de vários fármacos, podendo acarretar diversos problemas à vida do paciente. A Organização Mundial de Saúde1 (OMS) conceitua como polifarmácia o uso rotineiro e concomitante de quatro ou mais medicamentos (com ou sem prescrição médica) por um paciente, mas habitualmente o número de medicações tomadas por uma pessoa enferma vai muito além disso.
A polifarmácia constitui hoje um dos problemas mais comuns nos cuidados continuados do idoso que, em geral, está tratando mais de um problema de saúde1 ao mesmo tempo. E é importante lembrar que nem todo paciente que esteja usando vários medicamentos está fazendo uso de excesso de medicação. Muitas vezes, o próprio médico vê-se obrigado a receitar vários medicamentos para um só paciente. Imagine-se, por exemplo, um paciente diabético, com pressão arterial2 e colesterol3 elevados, que já mostre sinais4 de osteoporose5 e reumatismos. No mínimo, ele terá de receber cinco a seis remédios. Essa é, digamos assim, uma "polifarmácia do bem" e imagina-se que o médico conheça as reações e os efeitos das interações das medicações que receita.
Há também uma outra polifarmácia, a daqueles pacientes que acrescentam medicações de venda livre por própria conta, levados pela propaganda ou por conselhos de outras pessoas e por uma expectativa mágica a respeito dos remédios.
No Brasil estima-se que 23% da população consome 60% da produção nacional de medicamentos, especialmente as pessoas acima de 60 anos. Um estudo realizado na cidade de São Paulo apontou que 84,3% desses pacientes usavam vários medicamentos. E isso para não falar dos idosos com “mania” de remédio, que costumam comprar e usar por própria iniciativa grande número de remédios vendidos sem receita. Como exemplo, numa caixinha de remédios de um idoso de 70 anos foram encontrados mais de 30 desses produtos, que ele tomava alternativamente segundo conveniências que ele próprio estabelecia.
Por que polifarmácia?
O paciente pode ter mais de uma doença ao mesmo tempo ou uma só doença pode necessitar de vários medicamentos para controlar seus sintomas6. As pessoas idosas estão em maior risco de necessitarem de uma polifarmácia (prescrita ou automedicada) e de terem uma reação adversa devido à própria medicação ou a uma interação medicamentosa indevida, porque elas são propensas a terem muitos problemas de saúde1 e, assim, podem estar tomando vários medicamentos de venda livre ou prescritos.
O problema é ainda maior quando pensamos no recente aumento exponencial da prevalência7 de doenças crônicas e sequelas8 que acompanham o avançar da idade, no poder de marketing da indústria farmacêutica e na crescente medicalização dos problemas da vida, presente na formação de parte expressiva dos profissionais da saúde1. Infelizmente, o que era antes visto como uma simples tristeza passageira, passou a ser tratado e medicado como uma depressão por muitos profissionais da área.
Quais são os riscos da polifarmácia automedicada?
Comumente acontecem na polifarmácia as reações adversas e as respostas indesejadas a um determinado medicamento, mesmo se utilizado em doses normais. Elas podem acontecer a qualquer pessoa, mas nos idosos elas representam um importante problema de saúde1, seja pela frequência com que ocorrem seja pela gravidade que podem assumir. A idade por si só não representa um fator de risco9, mas no grupo dos idosos normalmente há uma maior incidência10 de doenças e a farmacocinética (mecanismos de administração, absorção, distribuição, biotransformação e eliminação dos medicamentos) já está alterada nessas pessoas.
As reações adversas podem acontecer com medicamentos prescritos pelo médico, mas acontecem com muito maior frequência com medicamentos tomados sem prescrição. Em geral, as reações adversas a medicamentos (RAM) são associadas a desfechos negativos da terapia.
As interações medicamentosas indevidas (IMI) ocorrem quando um medicamento influencia a ação de outro de forma negativa. A gravidade, prevalência7 e possíveis consequências das interações medicamentosas indesejáveis estão relacionadas a variáveis como condições clínicas dos indivíduos e número e características dos medicamentos, mas mesmo nesse caso elas podem ser agravadas pelo mau uso não intencional que ocorre devido a problemas visuais, auditivos e de memória, comuns nos idosos. Com medicamentos não prescritos, tomados por iniciativa própria, as IMI acontecem com muito maior frequência.
Como o médico identifica os malefícios da polifarmácia?
O médico sempre deve levantar a história clínica do paciente. O diagnóstico11 de RAM e da IMI depende, em muito, do relato do paciente e de seus familiares. Não há sinais4 ou sintomas6 típicos e exclusivos e, por isso, muitas vezes essas condições imitam sintomas6 de doenças, deixando de ser identificadas ou relatadas como tais.
Como manejar os malefícios da polifarmácia?
Em muitos casos, o “tratamento” da RAM ou da IMI inclui a inclusão de novos medicamentos à terapêutica12, elevando ainda mais o risco da cascata iatrogênica13. O ideal, quando possível, é realizar a suspensão ou redução da dose dos medicamentos envolvidos. O profissional de saúde1 pode fazer um bom gerenciamento da polifarmácia através de uma revisão de todas as medicações usadas pelo paciente em cada uma das consultas realizadas.
Leia também "Os perigos da automedicação14" e "Iatrogenia - o que é?"
Referências:
As informações veiculadas neste texto foram extraídas principalmente dos sites da SBGG – Socidade Brasileira de Geriatria e Gerontologia e do Cofen – Conselho Federal de Enfermagem.
As notas acima são dirigidas principalmente aos leigos em medicina e têm por objetivo destacar os aspectos mais relevantes desse assunto e não visam substituir as orientações do médico, que devem ser tidas como superiores a elas. Sendo assim, elas não devem ser utilizadas para autodiagnóstico ou automedicação nem para subsidiar trabalhos que requeiram rigor científico.