Gostou do artigo? Compartilhe!

Antidepressivos: eles estão sendo usados em excesso?

A+ A- Alterar tamanho da letra
Avalie este artigo

O que são antidepressivos?

Antidepressivos são medicamentos que atuam no Sistema Nervoso Central1, com vistas a normalizar o estado do humor, quando ele se encontra rebaixado por uma depressão. Esses medicamentos não atuam elevando o estado normal do humor, no que se distinguem dos psicoestimulantes, nem sobre as depressões reativas a intempéries da vida.

As doenças depressivas são consequência de modificações da transmissão neuroquímica entre os neurônios2 em áreas do sistema nervoso3 que regulam o estado do humor. Os antidepressivos procuram corrigi-las. Ao contrário dos psicoestimulantes eles não produzem dependência. Em geral, a ação terapêutica4 dos antidepressivos é relativamente lenta, de cerca de quinze dias, em média, mas a recuperação pode tardar um mês ou mais.

Saiba mais sobre "Depressão".

Quais são as causas do uso abusivo dos antidepressivos?

Ultimamente, o conceito de depressão se alargou muito e com isso o uso de antidepressivos disparou ao longo das últimas duas décadas. Os motivos para isso são:

  1. O conceito de depressão tem sido aplicado com muita liberalidade. A depressão está sendo diagnosticada em excesso, sem satisfazer o descrito no Manual Diagnóstico5 e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM).
  2. Os meios de comunicação veiculam propagandas que promovem antidepressivos.
  3. A população tem pedido, cada vez mais, medicamentos antidepressivos a seus médicos. Simples insatisfações com a vida ou a dificuldade de lidar com elas estão sendo incluídas no diagnóstico5 de depressão e erroneamente se tornando motivo para o uso de antidepressivos.

Para se ter uma ideia desses exageros, basta a constatação de que uma em cada quatro mulheres americanas na faixa entre 40 e 50 anos toma antidepressivos!

O diagnóstico5 de depressão passou a abranger um espectro muito amplo de ocorrências psicológicas, mas somente umas poucas entre elas seriam verdadeiramente tributárias ao uso de medicações. Uma reação normal, passageira, de decepção ou perda, não deve ser tratada com medicação mas, se for o caso, com psicoterapia. Num consultório de clínica geral as genuínas “depressões-doenças” são extremamente raras. No entanto, todos os indivíduos diagnosticados com “depressão”, mesmo sem um motivo plausível, recebem medicação antidepressiva. Observe-se ainda que quase sempre essas receitas partem de clínicos gerais ou especialistas que não receberam nenhum treinamento em saúde6 mental.

Como diferenciar a verdadeira depressão da mera reação depressiva?

Não há um teste de laboratório capaz de diagnosticar a verdadeira depressão e a necessidade de um antidepressivo. O diagnóstico5 da depressão é uma tarefa inerentemente subjetiva, com base nos sintomas7, na história clínica e na observação. Uma verdadeira depressão, contudo, exibe sintomas7 muito nítidos:

  1. Ausência de fatores causais vivenciais. Ela pode acontecer inclusive “quando tudo está muito bem”.
  2. Presença de tristeza profunda, expressa corporalmente.
  3. Falta de interesse mesmo pelas coisas que antes entusiasmavam o paciente.
  4. Sintomas7 que prejudicam o funcionamento cotidiano do paciente, como ganho ou perda de peso, alterações do sono, lentificação das reações, fadiga8 e pouca energia.
  5. Sentimentos de inutilidade ou de culpa excessiva.
  6. Dificuldade de concentração.
  7. Pensamentos recorrentes de morte que às vezes se realizam sob a forma de suicídio.

É preciso, pois, distinguir verdadeiras depressões de meras reações depressivas. Enquanto as primeiras têm uma base bioquímica cada vez mais bem conhecida e costumam responder espetacularmente aos antidepressivos, as outras não o fazem e devem, no máximo, ser tratadas com uma abordagem psicológica adequada. Em muitos casos, a eficácia dos antidepressivos receitados não passa daquela dos efeitos placebos.

Leia também sobre "Suicídio", "Depressões" e "Psicoterapias".

Quais são os perigos de um antidepressivo receitado inadequadamente?

Os antidepressivos geram efeitos colaterais9 incômodos e alguns podem levar a reações graves e mesmo fatais. Assim, eles podem causar disfunção sexual, dependência e síndrome10 de privação (pouco comum), mania/hipomania, suicídio após o início da terapia, aumento no tempo de sangramento do paciente, boca11 seca devido à redução do fluxo salivar, aumento na secreção de prolactina12, perda de apetite, constipação13 intestinal e síndrome serotoninérgica14.

Além disso, os antidepressivos inibidores da monoaminoxidase15, quando associados a outros antidepressivos ou a certos alimentos que contenham tiramina (queijos envelhecidos, vinhos, chope, pão de queijo, casca de banana, salames, presuntos, linguiças, mortadelas, patês, panetones, etc.), podem desencadear crises hipertensivas e todas as consequências delas, como acidentes cardíacos ou neurológicos. Alguns outros remédios, como descongestionantes e antigripais, também devem ser evitados pelos mesmos motivos.

Veja mais em "Depressão em mulheres", "Distimia", "Transtorno bipolar do humor" e "Transtorno de ansiedade generalizada".

 

ABCMED, 2016. Antidepressivos: eles estão sendo usados em excesso?. Disponível em: <https://www.abc.med.br/p/psicologia-e-psiquiatria/1275643/antidepressivos-eles-estao-sendo-usados-em-excesso.htm>. Acesso em: 19 mar. 2024.
Nota ao leitor:
As notas acima são dirigidas principalmente aos leigos em medicina e têm por objetivo destacar os aspectos mais relevantes desse assunto e não visam substituir as orientações do médico, que devem ser tidas como superiores a elas. Sendo assim, elas não devem ser utilizadas para autodiagnóstico ou automedicação nem para subsidiar trabalhos que requeiram rigor científico.

Complementos

1 Sistema Nervoso Central: Principais órgãos processadores de informação do sistema nervoso, compreendendo cérebro, medula espinhal e meninges.
2 Neurônios: Unidades celulares básicas do tecido nervoso. Cada neurônio é formado por corpo, axônio e dendritos. Sua função é receber, conduzir e transmitir impulsos no SISTEMA NERVOSO. Sinônimos: Células Nervosas
3 Sistema nervoso: O sistema nervoso é dividido em sistema nervoso central (SNC) e o sistema nervoso periférico (SNP). O SNC é formado pelo encéfalo e pela medula espinhal e a porção periférica está constituída pelos nervos cranianos e espinhais, pelos gânglios e pelas terminações nervosas.
4 Terapêutica: Terapia, tratamento de doentes.
5 Diagnóstico: Determinação de uma doença a partir dos seus sinais e sintomas.
6 Saúde: 1. Estado de equilíbrio dinâmico entre o organismo e o seu ambiente, o qual mantém as características estruturais e funcionais do organismo dentro dos limites normais para sua forma de vida e para a sua fase do ciclo vital. 2. Estado de boa disposição física e psíquica; bem-estar. 3. Brinde, saudação que se faz bebendo à saúde de alguém. 4. Força física; robustez, vigor, energia.
7 Sintomas: Alterações da percepção normal que uma pessoa tem de seu próprio corpo, do seu metabolismo, de suas sensações, podendo ou não ser um indício de doença. Os sintomas são as queixas relatadas pelo paciente mas que só ele consegue perceber. Sintomas são subjetivos, sujeitos à interpretação pessoal. A variabilidade descritiva dos sintomas varia em função da cultura do indivíduo, assim como da valorização que cada pessoa dá às suas próprias percepções.
8 Fadiga: 1. Sensação de enfraquecimento resultante de esforço físico. 2. Trabalho cansativo. 3. Redução gradual da resistência de um material ou da sensibilidade de um equipamento devido ao uso continuado.
9 Efeitos colaterais: 1. Ação não esperada de um medicamento. Ou seja, significa a ação sobre alguma parte do organismo diferente daquela que precisa ser tratada pelo medicamento. 2. Possível reação que pode ocorrer durante o uso do medicamento, podendo ser benéfica ou maléfica.
10 Síndrome: Conjunto de sinais e sintomas que se encontram associados a uma entidade conhecida ou não.
11 Boca: Cavidade oral ovalada (localizada no ápice do trato digestivo) composta de duas partes
12 Prolactina: Hormônio secretado pela adeno-hipófise. Estimula a produção de leite pelas glândulas mamárias. O aumento de produção da prolactina provoca a hiperprolactinemia, podendo causar alteração menstrual e infertilidade nas mulheres. No homem, gera impotência sexual (por prejudicar a produção de testosterona) e ginecomastia (aumento das mamas).
13 Constipação: Retardo ou dificuldade nas defecações, suficiente para causar desconforto significativo para a pessoa. Pode significar que as fezes são duras, difíceis de serem expelidas ou infreqüentes (evacuações inferiores a três vezes por semana), ou ainda a sensação de esvaziamento retal incompleto, após as defecações.
14 Síndrome serotoninérgica: Síndrome serotoninérgica ou síndrome da serotonina é caracterizada por uma tríade de alterações do estado mental (ansiedade, agitação, confusão mental, hipomania, alucinações e coma), das funções motoras (englobando tremores, mioclonias, hipertonia, hiperreflexia e incoordenação) e do sistema nervoso autônomo (febre, sudorese, náuseas, vômitos, diarreia e hipertensão). Ela pode ter causas diversas, mas na maioria das vezes ocorre por uma má interação medicamentosa, quando dois ou mais medicamentos que elevam a neurotransmissão serotoninérgica por meio de distintos mecanismos são utilizados concomitantemente ou em overdose.
15 Inibidores da monoaminoxidase: Tipo de antidepressivo que inibe a enzima monoaminoxidase (ou MAO), hoje usado geralmente como droga de terceira linha para a depressão devido às restrições dietéticas e ao uso de certos medicamentos que seu uso impõe. Deve ser considerada droga de primeira escolha no tratamento da depressão atípica (com sensibilidade à rejeição) ou agente útil no distúrbio do pânico e na depressão refratária. Pode causar hipotensão ortostática e efeitos simpaticomiméticos tais como taquicardia, suores e tremores. Náusea, insônia (associada à intensa sonolência à tarde) e disfunção sexual são comuns. Os efeitos sobre o sistema nervoso central incluem agitação e psicoses tóxicas. O término da terapia com inibidores da MAO pode estar associado à ansiedade, agitação, desaceleração cognitiva e dor de cabeça, por isso sua retirada deve ser muito gradual e orientada por um médico psiquiatra.
Gostou do artigo? Compartilhe!

Pergunte diretamente a um especialista

Sua pergunta será enviada aos especialistas do CatalogoMed, veja as dúvidas já respondidas.