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Medicina e Espiritualidade

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Quais são as relações entre medicina e espiritualidade?

Até aqui, a história da Medicina passou por três modelos distintos de interpretar a enfermidade: o modelo mágico, o modelo religioso e o modelo científico-empírico atual, que pode ser compreendido em três momentos diferentes:

  1. A medicina estritamente materialista e fisicalista, iniciada no século XIX.
  2. O modelo mente-corpo, que se inicia após a Segunda Guerra Mundial e admite a influência das percepções, emoções, atitudes e pensamentos sobre o corpo humano1.
  3. A medicina transpessoal e translocal, que postula que a relação mente-corpo transcende os limites de espaço e tempo. A mente não é um local nem pode ser localizada.

Dessa evolução, resulta a compreensão de que as crenças espirituais têm um efeito positivo na saúde2 dos pacientes. Estudos bem elaborados já mostraram que as pessoas que praticam atividades espirituais têm maiores índices de felicidade, de se sentirem úteis e de ajuste pessoal e, com isso, tinham menores chances de doenças coronárias, enfisema3, suicídio e morte por cirrose4.

A espiritualidade do ser humano não implica sempre a fé numa divindade, ao estilo do Deus dos cristãos. A espiritualidade pode estar ligada à religião, mas não necessariamente. Toda pessoa é necessariamente espiritual, enquanto dotada de autoconsciência e de capacidade de reflexão sobre si mesmo. O ser humano seria um ser intrinsecamente espiritual, pois demonstra capacidade para refletir e autotranscender. Ou seja, ir além de si mesmo.

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Como a espiritualidade ajuda na medicina?

O professor Benson, da Faculdade de Medicina de Harvard, acredita que as crenças têm repercussões físicas e possuem um papel importante na prevenção e tratamento de enfermidades. Na sua opinião, a medicina é como um banco com três pés, que não pode funcionar sem um deles: (1) farmacologia5, (2) cirurgia e outros procedimentos médicos e (3) o cuidado consigo mesmo, que inclui o exercício físico, o descanso, a nutrição6 e as crenças pessoais.

Aqueles indivíduos com mais alto grau de espiritualidade em geral são mais tranquilos, mais comedidos e mais “sábios” quanto aos grandes enigmas da vida. A busca de significado é uma das necessidades fundamentais de todas as pessoas, e o fato de conceberem, ou mesmo de buscarem, um sentido distingue essas pessoas das demais, inclusive na sua saúde2.

Além disso, a pessoa espiritual sabe que não pode alcançar sua plenitude sem estar em relação com outros seres humanos numa relação de amor a outra pessoa ou a uma comunidade. O amor é uma emoção benfazeja que beneficia o próprio corpo. Para a pessoa religiosa, a expressão maior do amor é Deus, mas para a não religiosa, pode ser a liberdade, a justiça, a verdade, a solidariedade, a humanidade, etc. Ao contrário, a pessoa não espiritual é centrada em si mesma, de uma maneira míope e egocêntrica, e o egocentrismo é oposto a uma genuína espiritualidade.

Há autores que sugerem que a espiritualidade e a religião estão intimamente ligadas à constituição biológica do ser humano, inscritas nos seus genes. Em geral, os médicos não pensam assim, mas devem, ao menos, serem sensíveis e respeitosos diante das crenças de seus pacientes, sobretudo quando estão em situações de crise.

A espiritualidade não pode reduzir-se a mais uma terapia, que os médicos podem receitar para condições específicas, mas deve ser uma atitude geral que tem sentido em si mesma. Nem a espiritualidade necessita ser justificada pela medicina, nem a medicina pela espiritualidade.

Um histórico das relações entre espiritualidade e medicina

Desde há muito, o Homem compreendeu que os aspectos meramente fisicalistas não bastavam para explicar as situações das doenças. A princípio, aliás, elas foram inteiramente compreendidas como devidas a forças não mecânicas. Primeiro, tiveram uma interpretação mágica, atribuídas a entidades e a afeitos sobrenaturais e, posteriormente, foram associadas à religião.

Houve tempos em que as visitas à beira do leito eram feitas tanto por um médico como por uma freira ou padre. No âmbito popular, as benzeções se tornaram comuns e com frequentes relatos de bons resultados. Grande número de instituições médicas, como as Santas Casas de Misericórdia, por exemplo, foram fundadas e dirigidas por religioso(a)s e, ainda hoje, muitos hospitais e clínicas recebem nomes de santos.

Essa atenção pessoal aos pacientes, além dos aspectos meramente técnicos, e o seu convite à meditação, à oração, ao perdão e ao arrependimento contribuem em muito para melhorar o espírito do paciente e têm valiosas repercussões na sua fisiologia7 e nos seus modos de aceitar a enfermidade. Assim assistidos, os pacientes se sentiam mais confortados, mais tranquilizados e mais empenhados em suas melhoras.

Depois da Segunda Guerra Mundial e, como consequência dela, a Medicina procurou estender seus cuidados a aspectos imateriais das enfermidades, mas fez isso sem a ancoragem espiritual, descrevendo apenas um novo mecanicismo, agora psicológico. Isso resultou na Medicina Psicossomática, de tão grande influência até recentemente. Ela pode ter acrescentado novas compreensões ao “como” das enfermidades. No entanto, para além disso, é preciso compreender-se o que seja uma metafísica das enfermidades, que possa responder para o paciente uma questão fundamental: “por que eu?”.

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Referências:

As informações veiculadas neste texto foram extraídas principalmente dos sites da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, da University of Washington e da Harvard Medical School.

ABCMED, 2022. Medicina e Espiritualidade. Disponível em: <https://www.abc.med.br/p/vida-saudavel/1426605/medicina-e-espiritualidade.htm>. Acesso em: 25 abr. 2024.
Nota ao leitor:
As notas acima são dirigidas principalmente aos leigos em medicina e têm por objetivo destacar os aspectos mais relevantes desse assunto e não visam substituir as orientações do médico, que devem ser tidas como superiores a elas. Sendo assim, elas não devem ser utilizadas para autodiagnóstico ou automedicação nem para subsidiar trabalhos que requeiram rigor científico.

Complementos

1 Corpo humano: O corpo humano é a substância física ou estrutura total e material de cada homem. Ele divide-se em cabeça, pescoço, tronco e membros. A anatomia humana estuda as grandes estruturas e sistemas do corpo humano.
2 Saúde: 1. Estado de equilíbrio dinâmico entre o organismo e o seu ambiente, o qual mantém as características estruturais e funcionais do organismo dentro dos limites normais para sua forma de vida e para a sua fase do ciclo vital. 2. Estado de boa disposição física e psíquica; bem-estar. 3. Brinde, saudação que se faz bebendo à saúde de alguém. 4. Força física; robustez, vigor, energia.
3 Enfisema: Doença respiratória caracterizada por destruição das paredes que separam um alvéolo de outro, com conseqüente perda da retração pulmonar normal. É produzida pelo hábito de fumar e, em algumas pessoas, pela deficiência de uma proteína chamada Antitripsina.
4 Cirrose: Substituição do tecido normal de um órgão (freqüentemente do fígado) por um tecido cicatricial fibroso. Deve-se a uma agressão persistente, infecciosa, tóxica ou metabólica, que produz perda progressiva das células funcionalmente ativas. Leva progressivamente à perda funcional do órgão.
5 Farmacologia: Ramo da medicina que estuda as propriedades químicas dos medicamentos e suas respectivas classificações.
6 Nutrição: Incorporação de vitaminas, minerais, proteínas, lipídios, carboidratos, oligoelementos, etc. indispensáveis para o desenvolvimento e manutenção de um indivíduo normal.
7 Fisiologia: Estudo das funções e do funcionamento normal dos seres vivos, especialmente dos processos físico-químicos que ocorrem nas células, tecidos, órgãos e sistemas dos seres vivos sadios.
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